Um dia, em meados de 2020, quando existia a testagem nos estacionamentos dos shoppings, fui fazer o teste de covid porque tinha voltado de uma viagem para o Rio. Não estava com sintomas, mas queria saber se estava contaminada já que eu tinha viajado de carro, usado banheiros na estrada etc. Fiz os dois testes, um para saber se eu estava com covid e o outro, para saber se eu já tinha os anticorpos. O resultado deu negativo para a covid e positivo para os anticorpos; isso quer dizer que eu tinha tido covid assintomática, no meu caso, sem a mínima ideia de quando e em que ocasião eu tive, ou seja, não senti nada, nada.
Agora, recentemente, eu estava para tomar minha terceira dose da vacina, já estava na data, mas, como eu ia viajar novamente de carro para o Rio e ia trabalhar bastante, decidi tomar na volta da minha viagem a trabalho, afinal, pensei que estava bem protegida com as duas doses da vacina e os anticorpos da própria covid. Tinha acabado de falar ao telefone com uma amiga que estava de cama, recuperando-se da terceira dose. Achei que o mais sensato seria adiar para 20 dias depois, cumprido o trabalho.
Só que não foi assim que aconteceu: entre o Natal e o Ano Novo, fui contaminada. Estava com os sintomas, mas achava que era gripe normal, afinal, no ano passado, corri tanto em risco indo de São Paulo ao Rio, toda semana gravando novela e não tinha pego nada… Voltei para São Paulo no dia 30 de dezembro e já senti que não era só uma gripe — no meio da estrada, tive uma dor de barriga enorme. Assim que cheguei à minha casa, em São Paulo, fiz o teste — tenho uma caixa de testes (antígeno) comigo por causa das gravações que estou fazendo e produzindo.
Deu positivo nos primeiros segundos, e a carga viral era alta. O traço parecia feito de pilot vermelho, largo.
Mas eu estava razoavelmente bem: sem febre, sem dor de cabeça nem dor no corpo.
Acontece que a dor de barriga não passava, não dava nem tempo de ir ao banheiro, a coisa acontecia no caminho. Dormindo, a mesma coisa. E não passava. Junto a isso, uma tosse sem fim. Começava no início da noite e ia até de manhã, depois apaziguava. No quinto dia, liguei para minha médica e comecei a tomar remédio para parar a diarreia, outro para a tosse. Só que eu já estava me sentindo fraca porque só comia arroz branco, bolacha água e sal e frango. Quando o remédio da tosse acabou, ela voltou — mais dois dias sem dormir.
Fazia lavagem nas narinas todos os dias, o que aconselho muito. Sem conseguir dormir e precisando recuperar as minhas forças, voltei a tomar remédio para dormir (há dois anos tinha conseguido me livrar deles), mas usá-los assim, na emergência, foi fundamental. Viva a ciência, porque eles me fizeram dormir muito bem. Mas, no final, depois do décimo dia, entrei no corticoide pra ficar boa de tudo. Então, a covid, pra mim, durou exatos 15 dias. Ainda não voltei aos exercícios. Quero ir aos poucos. Tomei um susto com a força desse vírus, querendo acabar comigo por dentro — sensação muito estranha. Porém o corpo humano é uma obra de arte. Ele luta para sobreviver com todas as suas forças. Não precisei me internar, graças a Deus!
Fico pensando nas pessoas que não têm condições de comprar os remédios que eu pude comprar, que não têm nem médicos para orientá-las. Pensei nas pessoas que não conseguem ficar boas em casa e precisam de hospital. Pensei em Eduardo Galvão, meu querido amigo, que não conseguiu vencer a covid, e em tantas outras vidas tão únicas e que se foram. A incógnita de como seu corpo vai reagir é assustadora. Vivenciar o vírus dentro de você, fazendo estragos no seu corpo, é doido. A natureza está pedindo a conta do que estamos fazendo com ela. E parece que todos nós vamos pagar por isso.
Virginia Cavendish é atriz.