A famosa Rua Dias Ferreira, ícone do Leblon e ponto para diferentes gerações, é conhecida pelo seu clima alegre, festivo e pela capacidade de atender a variados públicos e ocasiões — desde o jantar romântico em um primeiro encontro até grupos de amigos que querem comer e beber bem, sempre com o plus do garantido encontro com quem nem se tinha marcado. Esse sempre foi o grande barato da rua, e tudo isso acontecia de forma muito espontânea e agregadora, mas, ao mesmo tempo, organizada e mantendo o respeito.
Como proprietária de um dos restaurantes ali, que trabalha há 17 anos, buscando oferecer o melhor, o ano de 2020 certamente foi o mais frustrante e preocupante da história do Togu. Além da premente preocupação com a saúde de nós mesmos e de nossos amigos, familiares, funcionários e clientes, o distanciamento nos privou de uma das coisas que o carioca mais preza: o encontro. Ficamos distantes de pessoas com quem tínhamos contato frequente e vimos locais, como a Dias Ferreira, que costumavam transbordar energia positiva, absolutamente vazios, um retrato do momento difícil que vivemos.
Nesse contexto, obviamente é natural querer voltar às ruas, voltar a sair, comer, beber, conviver! No entanto, não podemos permitir que essa empolgação ocorra em detrimento de regras básicas de convivência em sociedade, e que sigamos testemunhando dias em que a Dias Ferreira se parece palco de um bloco de carnaval. A rua é, antes de mais nada, um espaço público e, agora mais do que nunca (sempre bom lembrar que seguimos vivendo na pandemia), leis precisam ser respeitadas. Mas como conter aglomerações se é direito de cada um, individualmente, sair e consumir? Não estou sugerindo que as pessoas não saiam; apenas que algumas regras sejam respeitadas:
• Os restaurantes da Dias Ferreira vêm respeitando as regras de distanciamento entre suas mesas;
• Temos visto um aumento do número de vendedores ambulantes nas ruas do Leblon. Além do fato de não venderem de forma regularizada, dentro da lei, é importante lembrar que os ambulantes não estão sujeitos à mesma vigilância sanitária dos bares e restaurantes, o que, no quadro atual que vivemos, é gravíssimo. Além disso, os ambulantes contribuem para as aglomerações em pé, cujo distanciamento é difícil de evitar.
• Outra prática comum tem sido pessoas levando caixas de som potentes (obviamente, sem nenhum tipo de autorização da Prefeitura) que exclamam pelas ruas, absolutamente indiferentes a restrições, como o horário de silêncio depois das 22h. Além do desrespeito aos moradores, a atitude contribui para o clima de bloco de carnaval e incentiva as aglomerações, que deveriam ser evitadas.
Sobre os bares e restaurantes terem sido liberados para funcionar sem horário para o fechamento, acho que trouxe uma tranquilidade muito grande. O carioca tem hábito de comer tarde; muitas vezes, chega para jantar à meia-noite. Nós nos víamos quase enxotando as pessoas. O Leblon, principalmente, é um bairro mais noturno e, por ter vários restaurantes na mesma rua, passa mais segurança.
Não quero soar conservadora ou puritana e, sendo 100% sincera, ver pessoas de volta às ruas, após longos meses de preocupação com a própria sobrevivência de um negócio que construí com sangue, suor e lágrimas ao longo de quase duas décadas, me traz alívio e alegria. Mas não podemos deixar de respeitar o espaço público, o próximo e o cuidado que o quadro pandêmico atual prescreve.
Denise Preciado é dona do Togu, o japa com cara de bistrô, na Dias Ferreira, inaugurado em 2003. Além de gestora do negócio, faz meio que o papel de anfitriã do seu restaurante.