A quarentena transformou meus dias num eterno domingo. Entra dia, sai dia, é tudo igual: leio um livro, escrevo alguma coisa, vejo um filme, durmo, acordo, e é hoje outra vez. Amanhã é o novo hoje. Para otimizar meu tempo, aproveito pra não fazer nada. Sou adepto do “nadismo” — do nada, vem a luz. Para achatar a curva da ansiedade que o confinamento traz, vejo gente se ocupando o dia inteiro na frente do computador, seja fazendo ioga, malhando, aula de zumba ou vendo uma live. Não aguento mais live.
Mas eu entendo: é pra aliviar um pouco a sensação de isolamento social. Devo confessar que já pratico isolamento há um bom tempo — adoro minha casa e convivo muito bem com a turma de mim mesmo, sem máscaras, e também com a gentileza e doçura, serviços essenciais oferecidos por quem a gente ama e que ama a gente. É muito gostoso papear com a família ou amigos, dando um zoom na conversa.
Receber mimos também é um bom momento da quarentena, embora cada descida até a portaria signifique horas desinfetando tudo com álcool, nova lavagem de roupa e banho. Isso, porém, não é uma crítica; é só um toque. Por fim, é, no mínimo, irritante ver gente circulando irresponsavelmente na rua, como se não estivesse acontecendo nada. Parabéns! Só que não, claro.
Tenho fantasias pesadas com esse tipo de gente, imagino vinganças cósmicas terríveis. Sei que não devo pensar assim até porque não adianta nada. Cá pra nós: já notou que a lei do retorno não funciona com gente babaca? Só funciona com quem é legal – repara. E se o hino da quarentena não é “todo dia é dia de finados”, é porque muita gente está em casa, respeitando o próximo, seguindo as orientações da ciência e da OMS. Portanto, fique em casa. Fique seguro. Stay na live.
Aloisio de Abreu é ator, escritor e diretor, com bom humor acima de tudo, Deus acima de todos.