Eu estava em quarentena clássica desde 19 de março, não saía pra nada, trancado em casa e tomando todos os cuidados necessários… No dia 11 de abril, atendendo ao pedido da minha mulher, Rachel, resolvi ir ao supermercado, mas com todos os cuidados (máscara, álcool em gel). Fomos em horário de pouquíssimo movimento, indicado para a terceira idade; depois, as compras foram só por delivery. Então acho que provavelmente nos contaminamos ali. Passados quatro dias, os sintomas se iniciaram, primeiramente na Rachel: febre, inapetência (nem água se consegue tomar), perda do olfato e paladar, cansaço surreal e prostração.
Na verdade, quando iniciaram os sintomas, e como tínhamos tomado a vacina da influenza e pneumococo 23 — portanto estávamos protegidos da gripe anual —, minha cunhada Luiza, resolveu fazer um protocolo sugerido pelos estudos epidemiológicos do Covid 19, achando suspeita a nossa sintomatologia. Depois de cinco dias de tratamento em casa e com os sintomas persistindo, ela nos encaminhou ao Hospital Copa D’Or para exames mais elaborados.
A tomografia apresentou pneumonia viral, imagem de vidro fosco, característica do Covid-19, tomando 50% dos meus pulmões e 25% dos dela. Aí, fiquei internado, direto na UTI – esse foi o momento muito difícil… O Dr. Lucas Augusto, que me atendia no momento, permitiu que minha mulher se despedisse de mim; senti que poderia não mais voltar a vê-la. Para mim, UTI era sinônimo de “reta final”… Via tanta notícia pela TV, só tragédia. O caminho da emergência até a UTI, na maca, acompanhado do maqueiro e de uma auxiliar de enfermagem, parecia um filme: os corredores brancos, as luzes muito claras. Confesso que estava apavorado, pois achei que precisaria de respirador.
Ao dar entrada na UTI, continuava apreensivo, mas o atendimento foi muito caloroso, atencioso e, principalmente, esclarecedor. Eles me diziam, passo a passo, o que estavam fazendo. Não precisei de entubação; isso me trouxe muita tranquilidade. Passei a acreditar que iria melhorar e psicologicamente fiquei muito bem. Fiquei três dias ali, todo monitorado, com oxigênio em cateter nasal, medicação endovenosa, fisioterapia, enfim, maravilhosamente bem atendido. No quarto dia, fui transferido para a Unidade Semi-intensiva e, no dia seguinte, 30 de abril, tive alta hospitalar.
A evolução da doença foi como o esperado: a pneumonia regrediu, olfato e paladar se normalizaram. Sinto-me disposto, alimentando-me bem, mas ainda terei uma medicação até o final de maio; hoje (07/05) estou ótimo! É um verdadeiro engano achar que a Covid-19 é uma gripezinha; só quem passa pela doença sabe… Pode até ser de forma mais branda para alguns, mas mata também. Quem vai pagar pra ver? Não é uma doença qualquer, é avassaladora, e o isolamento é necessário, pois é fato que provavelmente todos serão contaminados, e, se todos se infectarem ao mesmo tempo, não haverá sistema de saúde que dê conta. Na UTI onde eu estava, rede particular, havia nove baias, todas ocupadas.
O que quero dizer é “só saia de casa, numa real necessidade”. A gente sai diferente de uma experiência tão séria. Sou privilegiado, tenho uma estrutura, plano de saúde, pude usar uma rede de referência, uma casa onde posso tomar sol, uma filha guerreira que me dá todo o suporte (Tainah), Luiza, minha cunhada incansável, a minha fé e os amigos. Vejo agora como somos vulneráveis e como a solidariedade é tão importante e necessária.
Esta pandemia nos provou que não temos o domínio de nada neste mundo. Acho que muita coisa terá que mudar, e uma delas, a mais essencial, é a melhora do SUS, da saúde global, fundamental. Não tem política que deva interferir negativamente.
Quero aproveitar para agradecer a minha cunhada, Luiza Martins Vieira (infectologista), ao Dr. Lucas Augusto e toda a equipe de médicos, enfermeiros, técnicos de enfermagem, maqueiros e toda a galera da higienização do Copa D’Or por toda a dedicação, cuidado e carinho com os pacientes. Minha eterna gratidão!
Na foto, Carlinhos com o neto de quarto patas, Lunga.
Carlinhos de Jesus é ator, bailarino e coreógrafo, fundador da “Casa de Dança Carlinhos de Jesus” e diretor de uma companhia de dança com seu nome, com 18 dançarinos de salão (sambas, boleros, salsas, chorinhos, tangos etc). É jurado assíduo dos programas de dança na TV e personagem obrigatório do carnaval carioca.