A vinda de Judith Butler ao Brasil – uma das mais importantes filósofas dos Estados Unidos – tornou-se um amontoado de polêmica. Professora em Berkeley, ela está no País para um seminário entre esta terça-feira (07/11) e quinta-feira (09/11) no Sesc, em São Paulo, dentro da programação de “Os fins da democracia”. No fim do mês passado, um grupo de extrema direita protestou contra a vinda de Butler, acusada de promover a “ideologia de gênero”, motivando uma petição online (no site CitizenGo, que recebeu mais de 360 mil assinaturas).
Em resposta, atos de apoio e um “cordão democrático” foram convocados. A filósofa brasileira Marcia Tiburi, que apresentou o Brasil a Judith em 2015, comenta. “Leciono Filosofia e matérias afins desde 1994. Pelo menos desde 2005, eu uso Judith como referência bibliográfica. Na Universidade Presbiteriana Mackenzie, dava uma disciplina chamada História do Corpo. Usava o livro “Problemas de Gênero”, de Butler. Eram aulas que promoviam muito interesse. Havia pastores nas aulas, pessoas muito lúcidas, muito analíticas, críticas e abertas ao diálogo”, diz Márcia. “Nesses anos todos, de fato, nunca vi tamanha mistificação. Pessoas levadas por um esquema publicitário comandado por personalidades manipulatórias são induzidas a assinar manifestos sem saber o que, de fato, fazem. A discordância com as teorias de Butler é absolutamente normal e desejável, mas pelo menos deveriam ler o que ela escreveu e conhecer o que ela pensa. É impressionante ver como é fácil manipular as massas e como é complexo promover o discernimento e o esclarecimento. A mentalidade de nossa época é autoritária e sem reflexão”.
Butler está no Brasil como a principal pesquisadora de um trabalho que reúne intelectuais estudiosos do campo da teoria crítica (International Consortium of Critical Theory – UC Berkeley e Departamento de Filosofia da USP), como diz o site do Sesc.
“Se você pegar o meu livro “Como Conversar com um Fascista” (com 11 edições desde 2015) e “Ridículo Político”, eu desenvolvo teses sobre a personalidade autoritária. No primeiro, eu faço uma exposição sobre o cotidiano autoritário brasileiro, justamente para mostrar como as pessoas têm abandonado o pensamento reflexivo em nome de um sistema preconceituoso. No segundo, tento mostrar como a estrutura política foi transformada em publicidade para capitalizar. Como se a palhaçada tivesse juntado com a política em nome de uma enganação de massas. Os eleitores são tratados como otários. A vinda de Judith se transformou nesse mesmo tipo de manipulação. Foi criada uma teoria falsa segundo a qual ela é autora da “ideologia de gênero”, quando, na realidade, isso é uma ideologia dos políticos, de pastores diabólicos, antiteológicos, que agem com má-fé, manipulando a fé alheia. Eles se promovem em cima da ignorância dos outros; isso é mistificação e deveria ser crime. Disponho-me a dar uma aula pública sobre a obra de Judith Butler, e tenho certeza de que não fará mal a ninguém e vai ajudar cristãos e evangélicos a melhorar suas vidas.”