Tony sempre andou por perto, há 40 anos, quando vim do Rio Grande do Sul, para morar no Rio. Tínhamos amigos íntimos em comum. No final do ano passado, surgiu o convite para dirigir ‘Quem Tem Medo de Olga del Volga?’, e me surpreendi com uma escrita cômica e, ao mesmo tempo, com uma carpintaria teatral que me deixou muito entusiasmado para trabalhar. Logo me veio uma certa urgência; não sei exatamente o porquê. Eu acreditava muito, por ser essa coisa dessas peças do verão carioca, que ela falaria muito bem no contexto de verão e também de falar sobre esse lugar, desse transformismo, dessa arte, do transformismo e na escolha do local. E aí eu achei que tinha que ser antes do carnaval, de qualquer jeito, e meio que impus isso para a produção e que, por sorte, trouxe a possibilidade de ele poder testemunhar o trabalho, ver o valor do texto dele na peça, no sucesso que ela alcançou. Enfim, então, eu posso guardar, na lembrança e no contato físico, a vida ao lado do querido Tony.
Consigo ver a cara dele sentado na plateia da Turma Ok, surpreendido com a encenação, mas, ao mesmo tempo, percebendo que o texto dele era potente e tinha um discurso dramatúrgico, trabalhando com a comicidade e, simultaneamente, com a informação desse seu lugar de jornalista e cronista, sempre muito atento. Então, eu guardo o Tony rindo, assistindo a uma cria dele, uma cria que teve esse prazer, esse privilégio de criar junto com ele e que certamente vai seguir carreira. Quando um escritor tem sua obra viva em cena, ele está vivo, não é? Shakespeare está entre nós, Nelson Rodrigues está entre nós, Caio Fernando Abreu estará entre nós e tantos outros escritores maravilhosos, cuja obra transcende o tempo físico deles, de partilhar com a gente. Então, de alguma forma, eu espero que ele encontre logo a luz. A gente fica aqui muito triste pela partida dele, sem o humor dele, mas o levando sempre junto de nós.
Gilberto Gawronsky é diretor de teatro, convidado para dirigir o primeiro texto de Goes para o teatro, “Quem Tem Medo de Olga del Volga?”, inspirado na vida do artista argentino Patricio Bisso. Tony morreu nesta quinta (15/02), de falência hepática por complicações de um câncer no intestino. Em abril, a peça voltará ao Teatro Café Pequeno, no Leblon; depois, deve ir para São Paulo, onde o autor foi criado (ele nasceu no Rio). Num dos últimos textos para sua coluna, na FSP, Tony escreveu: “Sempre sonhei em escrever para o palco, mas a vida me levava por outros caminhos”, publicada no dia 20 de janeiro, dois dias depois da estreia no Rio, na Turma Ok., boate gay em funcionamento mais antiga do mundo, no Centro do Rio, com o ator Gustavo Klein, que interpretou Olga del Volga no filme “Hebe — a Estrela do Brasil”. O produtor teatral Marcelo Aouila, que Tony conhecia há anos, o chamou para fazer o texto, e a direção ficou com Gilberto, disse Goes: “Um dos mais respeitados do teatro carioca. Ele deu soluções que jamais me ocorreriam”.