Eu escolhi você — ou você me escolheu, acredito que tem alguma predição divina em torcer por uma equipe — porque torcer por você é uma forma diferente de lidar com as circunstâncias da vida. Uma possibilidade de existência em que acredito. Que abraço sem medo, sem dúvida de que é a única possível. Tem algo de trágico, melancólico, de irônico, de verdadeiro, de aceitar o que está fora do controle. Para nós, a conquista tem outro sabor, ela não é banalizada. É difícil, é rara, é extraordinária.
Eu escolhi o Botafogo como quem escolhe uma religião. O futebol é o mais próximo que temos da religião, e por isso o perigo do fanatismo, da paixão excessiva, das loucuras. Tem seu lado magnífico, de entrega, de êxtase. Tem o lado do medo, do rancor, do ódio.
Time transmitido pelo meu pai, o Botafogo virou um ponto de união, compreensão e fé entre o núcleo duro da minha família. Meu irmão partilha dessa mesma paixão e emoção que herdamos. E é por isso que vou criar meus dois filhos no Botafoguismo: por causa desse ethos, dessa maneira de encarar a vida sem ilusão, de lidar com o que não controlamos.
O Botafogo é querido por todos os outros times. Não conheço alguém que tenha ódio do Botafogo. O Botafogo é simpático, é adorado, é carismático. O Botafogo sofre bullying de vez em quando. O Botafogo é motivo de piada de vez em quando. O Botafogo é o mais próximo do mítico que o futebol conhece. O Botafogo tem uma história linda e está construindo um futuro brilhante como a estrela que reluz no seu escudo.
O Botafoguense tem fibra, tem caráter. É um povo que ri de si próprio, que se emociona, se descabela, que xinga o adversário, o próprio time, que diz que nunca mais volta no estádio para no jogo seguinte esgotar os ingressos em poucos minutos.
O que eu gostaria de te dizer, Botafogo, é que estou com você, na alegria e na tristeza, como um mantra e um juramento. Que não vou te abandonar na derrota — já não te abandonei em tantos momentos. Que eu frequentei os jogos no Caio Martins e acompanhei a série B com alegria, mas, é claro, eu quero que a gente ganhe. Quero gritar “É campeão!”, porque podemos, porque eu acredito. Você também precisa acreditar. Está nas nossas mãos, não depende de ninguém.
A gente não vai se acostumar nem trivializar a vitória, eu prometo. Mas vamos lutar por ela. Vamos jogar com o coração na bola. Com alegria, com confiança. Sem desespero. Sem colapso. Sem afobação. De toque em toque, rumo à rede.
Não tenha medo de vencer o campeonato. Não dessa vez.
A arte de perder não é nenhum mistério. Essa já conhecemos, somos especialistas nesse ofício. Nos acostumamos com ela por muitos anos. Esse ano é diferente. Você fez diferente. E nós estamos embasbacados com tudo que vivemos até aqui.
Só morre de medo de perder quem pode ganhar.
Eu entendo. Conquistar, um processo. Estar muito perto de conseguir, de chegar lá. O vazio iminente. O fim de uma etapa. Ter tudo a perder. Mas ter tudo a ganhar! Eu também já tive esse medo. Que medo é esse de ser feliz, Botafogo? Isso não vai fazer de você prepotente como tantos clubes que conhecemos. A soberba não é uma qualidade compatível com o Botafogo. Nem mesmo na vitória.
Não tenha medo de ser feliz, repito. Não agora, não nas próximas semanas.
A iminência da vitória é também a iminência da perda, por isso assusta, desespera. Não te tenha como adversário, Botafogo. A camisa doze está ao seu redor, cantando, vibrando, desejando a glória com que você fez teu nome.
Eu acredito em você. Esse é o momento mais importante de acreditar. E sei que você também acredita em si próprio.
Estamos juntos e, enquanto você toca a bola em campo, o coração pulula, quica pelo peito.
Agora é a hora.
Sempre com amor,
Luiza Mussnich nasceu no Rio, em 1991. É jornalista, escritora e mestranda em Literatura, Cultura e Contemporaneidade pela PUC-Rio. É autora dos livros de poesia “Tudo coisa da nossa cabeça”, “Lágrimas não caem no espaço”, “Para quando faltarem palavras” e “Microscópio”, todos pela Editora 7letras.