É chegado o ano novo judaico — o novo. Muito mais do que o inédito do porvir, é o não vivido do passado.
E faz sentido, pois como é que esperaríamos por aquilo que nem sequer sabemos ou conhecemos? O novo está inundado daquilo que nunca fomos, do que não pudemos viver ou realizar. Essa é toda a poesia e beleza do vazio do novo: estar repleto da vida ansiada, de sonhos não despertados, razão pela qual paramos para refletir e localizar esses “novos antigos”.
E uma vez prospectado esse “novo” daquilo que ainda não conseguimos ser, faz-se necessário um segundo movimento de pedir perdão, sempre mais impregnado de contrição e arrependimento pelo que não foi realizado, do que pelo que efetivamente tenha sido feito. Sim, o grande pedido de perdão é por não termos sido nós mesmos. Este é o novo: nós mesmos em versão mais íntegra!
E o ano novo é o aniversário do mundo, ou seja, o aniversário de todos nós.
É nesse espírito de um único aniversário, onde todos são aniversariantes, que viveremos estes dias. Por que para além das bênçãos de nos pensarmos e nos remoldarmos, há a festa de reencontros.
E como numa assembleia existencial anual, do alto do mirante da vida, podem ser contempladas as questões mais significativas do empreender de nosso tempo e esforço.
Que 5784 (o ano que se inicia!) seja um ano naturalmente adocicado sem adição de açúcares, apenas com o doce natural da composição das experiências puras de viver.
E que a reflexão proposta nestes dias possa inscrever-nos num novo patamar de consciência e despertar onde o novo seja o reencontro com as potencialidades deixadas pelo caminho.
Nilton Bonder é rabino, líder espiritual, escritor, com mais de 20 livros publicados (entre eles, “Alma Imoral”, que virou peça de sucesso).