Se você já está há algum tempo (digamos, meia hora) numa rede social e ainda não foi alvo do ódio de ninguém, comece a se preocupar. Você deve estar fazendo algo errado.
O mundo acadêmico foi criado para você disparar olhares de desprezo ou de inveja. A academia de ginástica, para você atrair olhares de inveja ou de desprezo. Ou vice-versa, dependendo do quão física ou intelectualmente dotado (ou desprovido) você seja. Já a rede social tem o nobre objetivo de salvar o ser humano da bile que vai se acumulando no fígado – e, se não devidamente convertida em ódio virtual, pode até matar. De raiva, mas pode.
Sou odiado; logo, existo. Ser odiado ou ignorado, eis a questão. Vim, vi e fui odiado. Odiai-vos uns aos outros. Ódio ou morte! Não se nasce odiador; torna-se odiador. Odiadores do mundo, uni-vos. Um pequeno ódio pelo homem, um ódio gigantesco pela Humanidade.
As frases só não foram essas porque surgiram antes de as redes sociais terem sido inventadas. Até então, havia apenas guerras sangrentas, genocídios brutais, rituais com sacrifícios humanos, execuções em massa — eventos que demandavam certa proximidade física e, eventualmente, direito de defesa.
Não mais.
O ódio agora pode ser disseminado do aconchego do seu lar, no ônibus, na fila do banco, enquanto faz o número 2. Todo dia é dia, toda hora é hora. Sem ter que dar nó corrediço em corda, empilhar lenha para a fogueira, afiar punhal, nada disso. Basta um celular com conexão e o Gengis Khan que habita em você — ou o Putin que alugou um Airbnb no seu coração — fará a festa.
Imagine sair de uma clínica do sono (kkkk!) depois de 18 horas de privação do dito cujo, e, ao tentar se atualizar com o mundo, encontrar mensagens do tipo:
“Queria pegar a cara de quem produziu isso e arrastar no chapisco.”
“o texto é completamente ridículo, imagino alguém que compartilha uma porcaria dessas e ainda acha que tá arrasando.”
“Um crossover “texto b0st4” de xenofobia, racismo, misoginia, machismo, … um megazord de falta de noção liberando o chorume da breguice.”
“Eu vomitei já no primeiro parágrafo.”
“Conseguiu ser racista, misógino, xenófobo”
“Acho que quem escreveu esqueceu de tomar seus remedinhos, não pode gente, acaba dando nosso, alucinações, para dizer o mínimo.”
“que coisa nojenta”
“Que surto meu Deus, racismo sim, mas muito surto, será que ninguém pensa em, sei lá, INTERNAR ESSAS PESSOAS????”
“Uma pergunta esses supremacistas apodrecem quando morrem ou isso acontece em vida mesmo.”
“Texto de Goebbels para Adolf”
“Só rezar para Deus levar logo.”
Era um texto antigo, meu, que caiu – devidamente editado – no Twitter.
Um texto irônico.
Mas ironia é que nem sarampo: tem gente que não pega.
Não foi a primeira vez, não terá sido a última.
Me lembro de um texto sobre os recibos falsos de aluguel, emitidos para um ex e atual presidente (prefiro não citar nomes) em que havia datas como 31 de junho e 31 de novembro. Escrevi propondo o fim dos privilégios concedidos a janeiro, março, maio, julho, agosto, outubro e dezembro. 31 dias para todos os meses! Nem um minuto a menos!
As rechitegues eram
#MexeuComUmMêsMexeuComTodos,
#NãoVaiTerGolpeNoCalendário
#JeSuisJunhoENovembro
#EOAluguelDoAécio?
Soa irônico? Levemente irônico? Não para as centenas de leitores que caíram de pau. “Imbecil” foi o epíteto mais singelo.
De outra feita, algo que escrevi sobre um bar hétero onde homens héteros podiam fazer sexo com outros homens héteros (sim, inauguraram um desses em São Paulo) acabou parando num grupo de esquerda. “Homofóbico” foi elogio.
Se você não foi linchado virtualmente, não se desespere. É porque não te descobriram. Ainda.
Quando acontecer, prepare um gin tônica, acomode-se no sofá, ponha seu melhor sorriso e saboreie o momento. Equivale a um Summa Cum Laude na vida acadêmica. Ou a levantar 300 kg no supino na SmartFit.
Sim, dói um pouquinho e pode até machucar. Mas não tem preço.