Sou ateu, e sempre ouço que as provas da existência de Deus estão por toda parte. A natureza seria o conjunto mais eloquente, porque só Deus poderia criar algo tão perfeito. Basta ter olhos para ver.
Pois eu olho em torno e me deparo com um planeta cuja superfície é 75% de água – só 25% destinados a nós, os donos do pedaço. Isso se considerarmos habitáveis os continentes ártico e antártico, os desertos, as selvas, os pântanos, a Sibéria, o Himalaia e os condomínios da Barra da Tijuca.
Se este planeta – com temperaturas extremas, vulcões, terremotos, tornados, enchentes, nevascas, avalanches, tsunamis, vírus, cascavéis, aranhas marrons, tubarões brancos, escorpiões, crocodilos, águas vivas, baratas voadoras, pernilongos, legos no chão e vizinhas de cima que arrastam móveis — é o lar que Deus projetou para sua criatura favorita, não quero nem imaginar o que nos esperaria se fôssemos os filhos do meio.
Somos os escolhidos e teríamos sido feitos à imagem e semelhança do Criador. Mas, vem cá: bastam três dias sem água, ou quatro minutos sem oxigênio, e… já éramos. Custava haver maior autonomia — uns seis meses, pelo menos? Para sermos tão perfeitos quanto os cactos e os seres anaeróbicos.
Custava os joelhos serem descartáveis, podendo ser substituídos por novos após 50 anos de uso? Custava os dentes serem em sistema de rodízio, como os dos tubarões, jamais necessitando limpeza de tártaro e tratamento de canal? Custava a batata da perna ser na parte da frente, que é onde a canela leva mais pancada? Os braços serem oito, como os do polvo, para a gente conseguir coçar as costas e passar protetor solar sem depender da caridade de estranhos? O cabelo no cocuruto ser cláusula pétrea? A ereção ser de ignição automática, dispensando esses obsoletos e pouco confiáveis mecanismos de bombeamento hidráulico?
Tá. Não vê quem não quer. Sou um taurino cabeça dura – que não acredita em horóscopo e não enxerga a obra divina a um palmo do nariz. Mas tenho tentado, juro. E, eventualmente, encontro coisas inexplicavelmente perfeitas — que talvez só pudessem mesmo ter sido projetadas por um ser superior. Por exemplo:
De que cor é o salmão? Salmão.
De que cor a abóbora? Abóbora.
A laranja? Laranja.
Como dizer que é tudo coincidência? Inclusive o ovo ser oval e o paralelepípedo ser um paralelepípedo — e não o contrário?
Num mundo originado do caos, do acaso, nada impediria que a baleia azul fosse salmão e o salmão, azul. Que o céu fosse azul marinho e o mar, azul celeste. A cor da água da piscina, azul turquesa, e a pedra do anel de turquesa… azul piscina! Mas não. E isso só pode ter acontecido por haver um design inteligente, o mesmo que fez o unicórnio ter um único chifre, e não cem, e a centopeia ter uma centena de pés, não apenas um. Ou a águia ter o bico aquilino, a cobra coral ser colorida, o assum preto ser preto e a onça ter a pele com padronagem de oncinha.
Ah, mas dirão os céticos (como eu), nem tudo é tão perfeito assim. Como não?
Onde nasceu o Marechal Floriano Peixoto? Em Marechal Floriano, Alagoas.
Onde nasceu Tiradentes? Em Tiradentes, Minas Gerais.
E Wenceslau Brás? Em Brazópolis, também em Minas.
Itamar? No mar…
Onde havia minas de ouro e pedras preciosas? Em Minas.
E diamantes? Em Diamantina.
Onde corre o Rio Amazonas? No Amazonas…
Onde fica o Corcovado? Bem embaixo do Cristo…
Se o Marechal Floriano tivesse nascido em Tiradentes, o Rio Amazonas corresse em Minas, as minas de diamante fossem no Rio da Prata e embaixo do Cristo ficasse, sei lá, o mar, aí sim poderíamos pensar no caos, na seleção natural, essas besteiras.
Mas repararam como na natureza tudo se encaixa? A mão tem o formato exato da luva. A dedo tem a forma cilíndrica perfeita para poder entrar no anel. O pênis fica na parte da frente do corpo, bem no lugar onde existe a braguilha. Orelha e nariz são o suporte ideal para os óculos — e os olhos também são dois, o mesmo número das lentes. O volante do carro fica diante do assento do motorista (menos na Inglaterra, onde quem dirige é o carona).
Tudo isso é prova, indício, evidência, sinal, testemunho e manifestação de uma intencionalidade divina.
E, se ainda há quem, como eu, não creia, lembre-se de que o bacalhau é um peixe de água salgada. Já pensou no desastre ecológico que seria um bicho salgado daqueles nadando num rio de água doce?
As provas estão aí. Não vê quem não quer.