Alguns anos atrás, pouco tempo antes de morrer enforcada pelo marido e com os três filhinhos dentro de casa, uma amiga minha veio me perguntar o que era a Comunicação Não Violenta (CNV); esse nome tinha chamado a sua atenção. Ela disse que talvez estivesse precisando disso para melhorar a relação com o marido, pois eles brigavam muito.
À época, nem passou pela minha cabeça a possibilidade de ela estar casada com um homem altamente abusivo e,
até, psicopata. Pelo que ela estava me contando, eu imaginava que eles estavam brigando como a maioria dos casais e que a CNV poderia ajudá-los, como já tinha ajudado muitos outros casais.
Ele era atencioso em público, carinhoso, prestativo e muito apreciado pelos sogros – que nunca suspeitaram de ele ter assassinado a filha, até descobrirem algumas provas pouco tempo depois. Foi um choque. Ele tinha conseguido seduzir e enganar a maioria das pessoas com quem se relacionava. Psicopatas costumam ser extremamente sedutores, envolventes, carismáticos e capazes
de enganar e manipular qualquer um — principalmente, os desavisados.
A minha amiga, como a maioria das mulheres que sofrem violência doméstica e que me escrevem diariamente, nas minhas redes sociais, não tinha contado isso à família por medo e vergonha de ser julgada.
Existe também uma banalização dos abusos na sociedade e uma falta de consciência em relação às diversas formas de violência doméstica. Muitas pessoas custam a acreditar, e as vítimas acabam se sentindo isoladas e sem apoio dos mais próximos. Inclusive, muitos terapeutas, que nunca passaram por um relacionamento abusivo, não entendem e invalidam o que essas vítimas estão passando.
“O estudo mais recente do Fórum Brasileiro de Segurança Pública sobre feminicídios mostra que, em 2021, uma mulher era assasinada, em média, a cada sete horas” no Brasil, só pelo fato de ser mulher.
O que isso tem a ver com a Comunicação Não Violenta (CNV)? Tudo.
Ninguém começa batendo, espancando, matando – existe um ciclo da violência, que sempre começa com atitudes de desrespeito mais sutis, verbais ou não verbais. À medida que a relação avança e se consolida, a violência aumenta de forma progressiva e cíclica.
A CNV pode ajudar a interromper esse ciclo da violência na maioria dos relacionamentos. Porém, quando o parceiro ou a parceira têm um perfil psicológico altamente abusivo e com pouca ou nenhuma chance de tratamento e de mudança — como narcisistas e psicopatas, por exemplo, não há CNV que resolva.
É importante se informar sobre esses transtornos mentais, assistir a vídeos, ler livros, fazer cursos, testes online de psicopatia e narcisismo (disponíveis na Internet e no meu perfil no Instagram @mariebendelac) e buscar apoio de profissionais qualificados.
Nesses casos, é recomendado o afastamento “do abusador”. Vale ressaltar que nem sempre o abusador é um homem — existem muitas mulheres abusivas e altamente perigosas. No entanto, tudo precisa ser feito com muito cuidado, estratégia, discrição e apoio, pois a maioria dos feminicídios acontecem na hora em que a mulher tenta se separar, como o foi o caso da minha amiga. Em casos mais extremos, será necessário pedir uma medida protetiva e, eventualmente, esconder-se por um tempo.
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