O marchand romeno Jean Boghici, morto há sete anos, certamente estaria vivendo o dia mais infeliz de sua vida. Só se fala em seu nome, nesta terça (10/08), e não em páginas de Cultura, mas nas policiais, depois de sua filha, Sabine, roubar mais ou menos R$ 720 milhões da própria mãe, Geneviève, de 82 anos, segundo investigações da polícia. Foram 16 quadros e esculturas vendidos para galerias de arte, entre trabalhos de Vicente do Rego Monteiro e Victor Brecheret.
Jean era um apaixonado por arte. Em 1961, Boghici fundou a galeria Relevo, em Copacabana e, apesar de aberta apenas por sete anos, foi fundamental para o mercado de arte brasileiro, lançando nomes como Antonio Dias, Rubens Gerchman, Frans Krajcberg e Guignard — a primeira mostra foi do também romeno Emeric Marcier (1916-1990).
Quando fechou, viajou pelo mundo e voltou ao Rio em 1979, onde fundou uma galeria com seu nome. Três anos antes de morrer, em 2012, um incêndio na cobertura dúplex em que morava em Copacabana destruiu obras de sua coleção particular, as mais queridas, como o quadro “Samba”, de Di Cavalcanti; além de um Guignard, um Segall, fotografias e documentos. Se mudou com Geneviève e a filha para outro apartamento, também em Copa. Logo depois fez uma exposição com o material que sobrou, no Museu de Arte do Rio (MAR). “Só pode ser marchand um idealista apaixonado pela arte ou um comerciante de grande visão ou de maior paciência”, costumava dizer.
Procurada, a curadora Vanda Klabin comenta: “Todo mundo das artes está em choque. O Jean e Geneviève sempre foram muito queridos. Ele era um homem inteligentíssimo, foi o responsável pela formação de grandes coleções brasileiras. Sobre a venda das peças, sendo ela filha do Jean, o mercado aceitou. A coleção dele não tinha uma peça que não fosse importante”. E completa: “Quando vi cedo o nome da operação da Polícia, Sol Poente, eu sabia que era dele. É um quadro da Tarsila”.