28 de junho foi o Dia Internacional do Orgulho LGBTQIA+
A data marca o aniversário da “Rebelião de Stonewall”, uma espécie de “Basta!” à discriminação sofrida pelos homossexuais — pelo menos nos Estados Unidos, ou pelo menos em Nova York. No resto do mundo, a banda toca em outro compasso, muito mais lento.
Sou do tempo em que ainda não havia tanta letrinha na sigla. Era só GLS: gays, lésbicas e simpatizantes.
Por algum motivo, limaram o S dos simpatizantes — pais, amigos, pessoas que apoiavam os direitos civis daqueles com orientação sexual diferente da sua. No lugar, entraram o B de bissexuais e o T de transexuais (que também vale para travestis).
As lésbicas se sentiram discriminadas e a ordem das letras (que não altera o produto) foi mudada para LGBT.
Depois vieram o Q de queer (pessoa que transita entre os gêneros masculino e feminino ou rejeita ambos os gêneros), o I de intersexo (pessoas com sexo indefinido), o A de assexual (que não sente atração por outra pessoa, independentemente do gênero) e o + (todas as outras possibilidades, já descobertas ou por descobrir).
Ainda assim, há de haver quem não se sinta representado por esse +. E antes que a sigla se torne ainda mais impronunciável, eu proporia algo mais inclusivo, do tipo ABCDEtc.
Sendo:
A de apático/a/e – O que todos acabamos por nos tornar depois de uma feijoada, de certa idade ou de duas horas acompanhando tretas no Twitter. Se encontrar um/a/e desses/os/as, não insista;
B de benevolente/o/a – Não foi lá essas coisas (quase nunca é lá essas coisas…), mas responde com um “hum hum” (sem parar de teclar ao celular) à clássica pergunta “foi bom pra você?”. Seja benevolente/o/a; não custa. Fuja dos/as benevolentes/os/as; você merece coisa melhor;
C de curioso/a/e — Sabe aquela vontade irresistível de cair numa cilada? Pois é.
D de distraído/a/e — Que só no dia seguinte, já sóbrio/a/e, é que se dá conta do estrago. Atire a primeira pedra quem nunca;
E de educado/a/e — Que fica sem jeito de dizer “não” (e “não” foi feito pra gente dizer);
F de focado/a/e — É esforçado/a/e, perseverante/o/a, resiliente/o/a. Dedica-se com afinco. Do tipo que seria um/a/e ótimo/a/e datilógrafo/a/e, jamais um/a/e pianista/o/e.
G de gauche/o/a — É o oposto do/a/e focado/a/e: troca os pés pelas mãos, faz tudo fora do script, transforma qualquer coisa numa lambança danada. Vale muito mais a pena, vai por mim;
H de humilde/o/a — Coisa rara. Se encontrar, me passe o contato, por favor;
I de ingênuo/a/e — Deve haver ainda um/a/e ou dois/duas/dues exemplares/os/as na natureza. Se encontrar, acione o Ibama;
J de jurássico/a/e — Quem quer que saiba o que são (ou foram) floppy disk, ICQ, teletrim, fax, Malt 90 e monogamia;
K de Kléberson — Kléberson acha que nenhum rótulo o define, e precisa de uma letra só para si. Não seja como o Kléberson;
L de lascivo/a/e — Do tipo “beijando bem, que mal tem?”. Caem exponencialmente as chances de ficar sozinho/a/e numa sexta-feira;
M de meigo/a/e — Esqueça. Se levar adiante, será por sua conta e risco. De meigo/a/e para meloso/a/e é um pulo. Depois não diga que não avisei;
N de normal/o/a/e/ — Só existe de longe; de perto, ninguém é;
O de organizado/a/e — Se tirou a roupa, dobrou, e empilhou na cadeira, peça licença para ir ao banheiro e fuja pelo basculante. Dão ótimos/as/es contadores/os/as, péssimos/os/as amantes/as/os;
P de paciente/o/a — Paciência é uma virtude; se você ainda não chegou nos 30, vai precisar de alguém assim para conter seu ímpeto; se já passou dos 30, vai precisar de alguém assim para te esperar recuperar o ímpeto perdido;
Q de quieto/a/e — Prepare-se! Os ditados “Águas paradas são profundas” e “Não mexa com quem está quieto” não surgiram por acaso;
R de respeitador/a/e — Dão ótimos genros/as/es e noras/os/es. Não há outro uso conhecido;
S de safado/a/e — Ótimo/a/e por 15 minutos, meia hora. Depois cansa;
T de tradicional/o/a/e — Dão ótimos/as/e esposos/as/es. Para marido/a/e, mulher/o/a/e, amante/o/a ou rolo/a/e, tente o restante do alfabeto – menos o “R”, o “O” e o “A”, ou vai ficar na mesma;
U de único/a/e — “Um é pouco, dois é bom, três é… demais!”. Que cada um/a/e seja único/a/e enquanto dure;
X de xatiado/a/e — Evite. É xatiação na certa;
Z de zen/o/a/e — Invista. Vá fundo. Com unhas e dentes. Não deixe escapar. Pode não dar mais tempo de fazer Bodas de Prata (de Ouro, nem pensar), mas um fim de semana, que seja, com alguém/o/a/e que tenha a mente aberta, a espinha ereta e o coração tranquilo vai fazer diferença na sua vida.
A sigla ABCDEtc é, portanto, mais inclusiva — serve para homos e héteros, cis e trans, assexuais e pansexuais. Nela, cabe todo mundo. E o “Etc” deixa em aberto a possibilidade de, depois do Z, engatar um Alfa e ir até Ômega.
Se bem que eu ache que o H de Humano/a/e bastasse.