Não. Mãe são muitas.
A que amamenta, acalanta, perde o sono, troca a fralda.
A que dá papinha, troca a fralda, perde o sono, se espanta como a criaturinha desconjuntada de outro dia já se firma no colo.
A que troca a fralda, perde o sono e acompanha o ser que agora engatinha.
A que perde o sono, troca a fralda, e oferece a mão para os primeiros passos de alguém que se se equilibra, cai, balança, hesita, cai, levanta e caminha.
A que se espanta com esse ser que descobriu a fala, e que dispara pela sala, e lhe tira o sono com uma febre, uma virose, um galo na testa.
A que perde o sono com o primeiro ‘por que’ sem resposta, o primeiro dia na escola, a primeira briga no pátio, o primeiro osso quebrado, a primeira nota vermelha, o primeiro choro escondido, a primeira mancha no lençol, o primeiro mênstruo.
A que não dorme enquanto você não chega em casa. Enquanto você não liga avisando que a viagem foi boa e você chegou bem. A que demora a pegar no sono depois que você avisa que quer que ela conheça alguém.
A que chora na cerimônia. A que diz que ainda não é hora de ser avó. A que acalanta e troca a fralda para que você consiga pegar no sono. A que prepara a papinha, a que sorri quando alguém engatinha, e oferece a mão, e diz para você não se desesperar, que é só colocar uma compressa gelada com sal e vinagre na testa.
A que diz que você pode ficar o tempo que quiser, até que tudo se resolva. E te oferece colo, e te acalanta.
A que esquece onde deixou as chaves. E não se lembra mais do seu nome. E quer voltar para a casa da mãe, e para quem você faz uma papinha, acalanta, e por quem perde o sono, e de quem você troca a fralda.
Mãe não é uma: são muitas. E nenhuma delas dura mais que uma nota de acalanto, um aconchego no peito, um minuto (perdido) de sono.
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