Quantas pessoas, por estarem vivendo o sofrimento pessoal, diante de uma dificuldade, mesmo tendo algum tipo de solução ao seu alcance, não conseguem aproveitar? E, ao contrário, quantas pessoas, por estarem vivendo o bem-estar pessoal, por mais que a vida esteja lhe desfavorecendo, frente a uma adversidade conseguem encontrar leveza para se conduzir satisfatoriamente?
Posso afirmar que, quase como uma lei da condição humana, uma pessoa feliz enfrenta e direciona as suas dificuldades de vida com muito mais leveza do que estando infeliz, cuja insatisfação pessoal torna bem mais difícil, mesmo diante de facilidades, o manejo do que lhe acontece.
Há 35 anos estudando o sentir, graduando-me em Física, com o único objetivo de assimilar outros olhares de mundo, cheguei, perpassando a Psicologia, Psicanálise, Física, Biologia e Artes, ao que nomeei de Ciência do Sentir.
Transitando no campo da transdisciplinaridade, migrei para visão vibracional de mundo, a que compreende a natureza, e a natureza humana, como um complexo vibracional uno, inteiro e indivisível, em que o sentir se realiza na experiência da vibração que emanamos, tanto externa quanto internamente, enquanto seres. Assim, abandonei a visão Newtoniana de mundo, uma visão materialista que compreende o Universo como uma grande engrenagem mecânica e contextualiza o ser humano como uma máquina biológica cujos sentimentos seriam resultados de sinapses neurológicas.
Se compreendido o sentir humano pelo viés vibracional, a sua visão se amplia para um olhar em que os sentimentos, agrupando-se em diferentes qualidades vibracionais, formam sistemas complexos. Sistemas que vão dar o tom ao sentimento de Eu e de onde emerge o Eu Sensível — “aquele recorte do Eu que, sendo capaz de experienciar o sensível de forma consciente, viabiliza o sentimento de Eu que cada um de nós tem de si mesmo” (Breves, B. O Eu Sensível. p.14. 2017).
Assim, por exemplo, quando uma pessoa está sentindo raiva, deve buscar compreender que outros sentimentos estão agregados a sua raiva. Se sentimentos de amor, esperança, determinação, persistência, etc., a pessoa tenderá a sentir-se fortalecida na busca de um objetivo construtivo. Todavia, se agregada aos sentimentos de ódio, vingança, intolerância, repulsa, etc., a pessoa tenderá a sentir-se fortalecida na busca de um objetivo destrutivo.
O que pontuei em relação à raiva também acontece com os demais sentimentos como, por exemplo, ciúme, tristeza, esperança, gratidão, altruísmo, paciência, desapego, vaidade, perdão, confiança, curiosidade, saudade, culpa e com os mais de quinhentos sentimentos que vibram, ou estão pronto para ser ativados, formando diversos diferentes grupos de vibrações diferenciadas dentro de cada um de nós, o que nos impulsiona na direção de nossos objetivos, de forma construtiva ou destrutiva.
Enfim, através desse olhar, também é possível perceber o Sentir como uma constante humana, ou seja, aquela que ultrapassa os tempos, as épocas e as culturas. Levando-se em consideração as diferenças de uma experiência subjetiva, qualquer um de nós pode minimamente compreender o que uma pessoa do século III a.C., II d.C., XIX d. C, enfim, de qualquer tempo, está querendo dizer quando fala que sofre pela ausência de alguém, visto que conseguimos experimentar, de maneira equivalente à vibração dos sentimentos.
Fato é que vivemos em uma cultura que não valoriza os sentimentos, que, além de relegados ao segundo plano, costumam ser denegridos em sua expressão. “Engole o choro”, “Deixe de bobagem, Não fique triste”, “Não fica sofrendo, logo vai passar”, “Sentir raiva é feio”, etc. expressões que a maioria das pessoas costuma ouvir desde a mais tenra infância. E isso prejudica a harmonia interna da pessoa, portanto, a sua saúde mental.
Percebo os sentimentos funcionando como sinfonias que vão sendo compostas e tocadas em cada orquestra pessoal. Sinfonias que vão sendo regidas conforme o talento que a pessoa possui para administrar as suas angústias, ansiedades, alegrias, raivas, amores, etc., enfim, os sentimentos que vão compor a sinfonia do Eu da pessoa ao longo de sua história. E essa seria a grande importância dos sentimentos para a saúde mental humana, pois saber administrar o que sente é saber compor para si melhor uma qualidade de vida e, também, conseguir diante das adversidades, valendo-me de um ditado popular, “fazer do limão uma limonada”.
Para finalizar, penso que os últimos acontecimentos com o sofrimento em consequência da pandemia nos servem de alerta para a urgência de migrarmos da compreensão do ser humano como uma máquina biológica perfeita para o ser humano como um complexo bio/psíquico/social vibracional que, diferentemente de uma máquina, é humanizado e pode SENTIR.
Beatriz Breves é psicóloga, psicanalista, bacharel e licenciada em Física. É presidente, membro efetivo e fundadora da Sociedade da Ciência do Sentir (SoCiS) e autora de oito livros sobre o tema, entre os quais, o lançamento “Entre o mistério e a ignorância — o desvendar da psique humana”.