Comecei a fazer lives para animar meus amigos, que estavam reclamando muito e bem desanimados no início da pandemia. Eu fazia vídeos motivacionais e lives com pessoas que achavam que tinham um domínio, um equilíbrio na vida. Comecei uma vez por mês e, quando percebi que as pessoas estavam gostando, passei a fazer uma vez por semana. Amigos que viraram seguidores, que viraram um público fiel, ficaram me elogiando, pedindo mais, sugerindo convidados, e a coisa foi crescendo. Aí eu tive a ideia de focar mesmo, fazer um programa, um podcast. Assim nasceu o “No Alvo”. Hoje, faço quatro vezes por semana e pretendo passar a fazer cinco ou mais.
Acho que o sucesso a gente nota quando aquele seu amigo das antigas que tem sucesso, que sabe o que fala e o que faz, começa a tentar te ajudar, tratar o que você faz com seriedade. Aí a gente também acredita. O público não necessariamente é um sinal de sucesso; às vezes, pode ser o contrário, pode ser sinal de modismo temporário.
Quando comecei, em maio, eu tinha menos de três mil seguidores; hoje tenho mais de 140 mil. Nessa era das fake news, as pessoas estão de saco cheio de supostas autoridades citando supostos fatos. O podcast veio para ficar porque seria o equivalente às rádios- piratas que eram populares nos anos 1980. São pessoas, indivíduos que produzem conteúdo de todo tipo. Não são empresas com lucro na mente, com agenda política, com a integridade comprometida. Os produtores de podcast crescem por excelência, por audiência — é tudo orgânico e honesto, qualquer um pode entrar na corrida. Então, a tecnologia simplesmente “deu aval” para que as rádios-piratas chegassem a todos. Se tivesse essa tecnologia nos anos 1980, já teria acontecido, porque as pessoas preferem autenticidade à pomposidade. O monopólio dos conglomerados de mídia caiu, e o futuro é conteúdo produzido por indivíduos, nus e crus.
Um dos assuntos mais falados desta semana foi a nova rede social Clubhouse, que sugere uma associação aos clubes privados dos Estados Unidos e Europa. Para entrar, precisa ser chamado por um participante, que também o torna exclusivo, e só por iPhone. No entanto, já anunciaram que haverá versão para Android, então será só mais exclusivo no início. Funcionou porque eu não sou da seita Apple, e já estou me sentindo excluído, curioso para experimentar o novo app.
Foi assim que o Facebook começou e bombou. Em 2020, a empresa valia 100 milhões de dólares e hoje vale mais de 1 bilhão. O Clubhouse é a rede social que veio como resposta ao crescimento dos podcasts; já é uma nova febre e faz total sentido. O WhatsApp já tinha estabelecido mensagens de áudios como padrão. Faltava uma rede e chat baseados em áudio. E as lives cresceram, então o áudio em tempo real é o que o público mais quer porque nem todo mundo está a fim de se maquiar para gravar vídeos e, no áudio, ninguém se importa com aparências.
Eu quero trazer conteúdo inovador, criar e não perder um segundo do tempo do público. São conversas, e eu falo tanto quanto o convidado. Eu tento tirar da pessoa o que ela tem de inspirador. O benefício do público é entrar numa jornada com a gente sem ninguém saber o destino. Eles já conhecem aquela figura pública, mas não podem imaginar o que vai acontecer naquela química entre a gente, e o público participa também, no chat, durante a gravação. No final do episódio, eu dou um nome baseado no que foi revelado ali.
Quem escolhe os convidados é Deus. Quem sou eu!? Todo mundo que encontro, que é interessante, eu convido. As pessoas mais conhecidas são indicadas por outras que já participaram. Outro dia, fiz um episódio com um vendedor de pulseiras visionário que conheci em Trancoso (BA). Falamos de seu antepassado, Sinhô Pereira, chefe do Lampião. Já falei sobre a nova Constituição do Brasil com o deputado Luiz Philippe de Orleans e Bragança em outro episódio.
Já conversei sobre a causa do Curdistão com uma guerrilheira que luta contra Isis e já foi modelo de propaganda de cerveja. Uma das pessoas mais brilhantes que conheci recentemente foi João Nogueira, tecladista da banda do Sean Lennon (único filho de John Lennon com Yoko Ono) — queria fazer 200 episódios com ele, se pudesse. Eu faço o que faço por amor; me fascina aprender com a experiência de pessoas únicas. Não quero fama ou dinheiro, mas conversar com as melhores pessoas do mundo. E é bom que esses papos maravilhosos sejam gravados porque eu não quero viver esse privilégio sozinho.
Sonho em gravar com pessoas que defendem causas que eu não entendo muito bem. Quando conversei com uma líder do movimento feminista, aprendi muito sobre um mundo onde ainda eu sou um ET. Também gosto de conversar com gente que todo mundo julga, para ver se consigo decifrar o outro lado. Eu faria uma com o Kim Jong-un (o presidente da Coreia do Norte), por exemplo, só para perguntar se ele acredita nas coisas que ele mesmo fala.
Tem uma citação atribuída a Buda, “Se podes ver algo de bom em mim, então não está apenas em mim, mas em todos nós”. Acho que todo ser humano está escondendo alguma luz muito intensa. Tem gente que obviamente está e é um deleite com quem passar uma hora conversando com aquela pessoa. Tem outras pessoas que eu preciso suar, acreditar, pegar um machado, uma pá e fazer minha mão sangrar cavando, mas, de toda conversa, sai luz se você abrir o coração.
Eu não me acho inteligente, quero me tornar inteligente ou descobrir o tanto que ainda sou ignorante. Por alguma razão, eu nunca gostei da ideia de profissões e identidades estáticas. Tenho fascínio por sabedoria, conhecimento, pessoas. Então foi difícil parar num lugar, num caminho. Quando era mais jovem, queria fazer coisas mais divertidas e fáceis, então fui DJ, cantor, organizava festivais de música, escrevia pra revistas. Quando percebi que queria ter família, quis ganhar dinheiro e aprender sobre negócios, entrei de cabeça nesse mundo de gestão financeira, que é tão fascinante quanto a arte. Tudo que já fiz me deu uma visão de mundo capaz de ter conversas com todo tipo de gente. “No Alvo” me realiza tanto, que considero ter nascido pra fazer isso.
Eron Falbo, 35 anos, é gestor financeiro e investidor, além de escritor, cantor e compositor — em 2013, lançou o álbum “73”, com produção de Bob Johnston, homem por trás de discos de Bob Dylan e Johnny Cash — e já trabalhou em bancos, festivais de música, revistas e cruzeiros transatlânticos. Morou em 15 cidades, sete países e fala seis idiomas. Atualmente vive no Rio e comanda o podcast “No Alvo”, no o YouTube e Spotify.
Foto: André Luiz Mello