Nesta quarta, 10 de fevereiro, quando é celebrado o Dia do Atleta Profissional, data que homenageia todos aqueles que fazem do esporte a sua profissão, temos o que comemorar por um lado. Mesmo em tempos difíceis, de pandemia, o esporte foi um aliado de muita gente nesta quarentena, e também é motivo de aplausos que vários atletas tenham conseguido seguir com seus treinos. Alguns até já voltaram às competições, mas sem público. Eu mesma, no auge da pandemia, fiquei por quase cinco meses treinando em casa; eu me virava como podia. É claro que não é o ideal estar longe de um ginásio, sem os aparelhos adequados, mas ser atleta é também um ato de resistência.
Por outro lado, ressalto que ainda temos muitos degraus a subir principalmente, aqui, no Brasil, onde não somos um exemplo de profissionais necessariamente valorizados. Mais ainda, se considerarmos a Reforma da Previdência, que tornará difícil a aposentadoria no esporte. É complicada a situação de nós, atletas, quando o assunto é esse. Mais ainda agora, que o governo tenta aumentar o tempo mínimo de contribuição para que o cidadão possa se aposentar. Fica praticamente impossível se aposentar como atleta profissional no Brasil.
Vou me pegar como exemplo: comecei a minha carreira de atleta de alto rendimento em 1996. Com 12 anos de idade, fui campeã brasileira — na categoria adulta — pela primeira vez. Na época, o infantil podia competir nas outras categorias; as regras mudaram com o passar do tempo. Em 1999, competi meu primeiro Jogos Pan Americanos, no Canadá. Ganhei minha primeira medalha internacional e passei por muitas fases. Vi minha treinadora, Georgette Vidor, em 1997, ficar paraplégica em uma viagem de ônibus que fazíamos. Detalhe que Georgete estava no mesmo lugar onde eu estava sentada, horas antes. Aquilo foi um sinal. Não sabia, não entendia. Só tinha o sentimento de que tinha que continuar.
Em 2001, ganhei minha primeira medalha em campeonatos mundiais; já tinha passado pela Olimpíada de Sydney. Quero registrar aqui que, nessa época, Ronaldo, o fenômeno do futebol, me ajudou muito. A Confederação Brasileira de Ginástica, infelizmente, não tinha recursos, não tinha aparelhos. Éramos um país periférico no campo da ginástica. Tempos difíceis, mas que vi se transformar no início dos anos 2000, quando Diego Hypólito, meu irmão, Daiane dos Santos e Laís Souza ajudaram o Brasil na mudança de panorama. Me recordo que fui aposentada — não da forma correta, com os devidos benefícios. Nesse caso, queriam me ‘encostar’ mesmo, pela imprensa e pelos treinadores, muitas vezes. Mas não abaixei a cabeça. E nem parei.
Um atleta como eu e mesmo os diferentes de mim precisam ter um ‘Plano B’, profissionalmente falando. Amo o que faço, mesmo tendo ficado frustrada e decepcionada em muitos momentos, mas nunca pensei em desistir. De um tempo para cá, vi que precisava colocar em prática meu ‘Plano B’ e comecei a faculdade de Marketing, que termino no ano que vem. E já estou vendo alguns projetos nesse sentido, para quando for a hora de parar com o esporte. Até já escolhi o tema do meu TCC, que quero manter em segredo por enquanto. Mas adianto que, claro, tem a ver com o esporte.
Adoraria que nós, atletas, tivéssemos carteira assinada e garantias profissionais, como todos os trabalhadores brasileiros. Temos que nos unir para mudar a realidade dessa condição, que é uma verdadeiro atraso, uma questão cultural até, aqui no Brasil. Meu projeto de TCC tem a ver com isso e afirmo que não adianta só reclamar, tem que promover a mudança.
Mas não há como negar que, aos poucos, bem lentamente, temos avançado na profissionalização do esporte. Eu mesma sou prova disso e exatamente hoje (10/02), aos 36 anos, estou assinando meu novo contrato com o Flamengo. Vou com muita garra me preparar para defender o clube e pretendo, sim, tentar uma vaga nas olimpíadas de Tóquio, em 2021. É claro que, por causa da pandemia, não sabemos como serão as seletivas, como ficará o regulamento, enfim, tem uma série de questões. Mas este é o meu objetivo agora. E aos que dizem que ‘estou velha para competir’, dou risada. Criticar é fácil, mas se preparar todos os dias, subir lá nos aparelhos, fazer o que eu faço e defender a bandeira do meu país, não é tão simples assim.
Tenho como exemplo de garra, superação e longevidade o Robert Scheidt, que, aos 47 anos, segue atuando bravamente no seu ofício. Sei que tenho saúde e estrutura óssea para continuar fazendo o que amo por mais algum tempo. Ninguém pode definir os sonhos de uma pessoa, temos que respeitar o espaço de cada um. Eu me respeito, tanto que, ao longo da minha carreira, tive pouquíssimas lesões graves — e olha que competi cinco olimpíadas consecutivas (Sydney, Athenas, Pequim, Londres e Rio).
Conquistei muitos sonhos e passei a me sentir cada vez mais realizada. Meu nome é Daniele Hypólito e hoje, dia 10 de fevereiro, Dia do Atleta Profissional, começou uma nova etapa na minha vida e continuo, sim, firme. Sabe por quê? Porque amo o que faço e farei enquanto o meu corpo permitir e os meus olhos brilharem. O esporte transforma vidas. Viva os atletas!
Daniele Hypolito, ginasta, única atleta da história da ginástica brasileira a participar de cinco olimpíadas e a primeira medalhista mundial na história da sua modalidade.
Foto: Antonio Chahestian/Record TV
Por Acyr Méra Júnior