Nesta época do ano, crianças sonham com presentes. Este ano, velhos como eu esperavam, com a mesma ansiedade, uma vacina de Natal. Tem sido cruel assistir ao interminável debate sobre quais serão, enfim, as vacinas autorizadas e como, finalmente, poderão ser distribuídas. Estamos, simplesmente, perdendo tempo — e vidas.
O debate afastou-se do âmbito apropriado e rigoroso da validação científica e da adoção de boas práticas de distribuição e prioridades e faz parte de uma disputa inconsequente política e partidária. Não quero ficar refém dessa guerrilha das vacinas; não me interessa a origem geográfica ou ideológica. Podem ser o resultado de um casamento improvável, mas espero que feliz, entre a AstraZeneca e a Rússia; da parceria da Butantan com a chinesa Sinovac ou da sociedade entre a Pfizer e a Fundação Oswaldo Cruz, ou o resultado de qualquer outra combinação de conhecimentos e oportunidades. Não estou preocupado com uma overdose de vacinas. Vou procurar refugiar-me numa frase de exemplar brevidade dita em 1840 por Pedro II ao antecipar as responsabilidades de sua maioridade e adaptá-la, esperançoso, aos desafios de hoje: “Quero já”.
Em períodos de calamidade, os dias e mesmo as horas perdidas contam. O tempo deixa de ter sua passagem cadenciada e passa a produzir uma implacável contabilidade. Os números acumulados até agora já nos colocam perto do alto da lista de vidas perdidas; não é um pódio que devamos aceitar ou ambicionar. Nada dá mais pena do que morrer na praia ou quando um armistício já foi negociado e assinado.”
Marcos Azambuja é diplomata. Foi secretário-geral do Itamaraty e embaixador do Brasil na França e na Argentina, além de chefe da Delegação do Brasil para Assuntos de Desarmamento e Direitos Humanos, em Genebra. É conselheiro do Centro Brasileiro de Relações Internacionais. Em encontro recente, alguém pediu que se apresentasse em duas linhas, ao que o embaixador respondeu: “Conselheiro emérito do sempre. Fui tanta coisa que, se me ocupar do meu passado, não sobrará nada pro meu futuro.”