O vídeo da confusão na ocasião dos parabéns da aniversariante Maria Eduarda, de 3 anos, mostrando a briga com a irmã Maria Antônia, de 6 anos, viralizou na Internet. A cena da irmã caçula puxando o cabelo da irmã mais velha, depois de esta última ter apagado a vela antes da aniversariante, com um olhar de provocação, gerou muitas reações nas redes sociais. Em poucas horas, já surgiram memes e pacotes de figurinhas para mensagens de celular.
A primeira vez que eu vi a cena, três coisas chamaram muito minha atenção: o olhar de provocação da irmã que apagou a vela no lugar da aniversariante, o puxão de cabelo e a reação das pessoas adultas que estavam presentes. Enquanto tentavam arrumar o cabelo da Maria Antônia, a Maria Eduarda estava levando uma bela bronca, por ter agredido a irmã fisicamente.
Em nenhum momento, observei uma consequência negativa em relação à atitude da irmã mais velha, que pareceu ter provocado intencionalmente a caçulinha — segundo ela, por ciúmes.
Esse tipo de briga com agressões físicas entre crianças é muito comum e, logo, os pais ensinam aos filhos que não devem “bater” em ninguém; no entanto, a empatia e o respeito das emoções e das necessidades do outro raramente são ensinados. Essa situação ilustra perfeitamente um padrão comum na nossa cultura.
A violência psicológica, por ser menos perceptível e bem mais sutil, costuma ser minimizada, ou até ignorada, enquanto a violência física costuma ser menos tolerada e pode ser facilmente punida.
Mas, afinal, o que é a violência psicológica e como reconhecê-la? A Lei Maria da Penha determina que a violência psicológica é entendida como “qualquer conduta que cause dano emocional e diminuição da autoestima” ou “prejudique e perturbe o pleno desenvolvimento ou que vise a degradar ou controlar suas ações, comportamentos, crenças e decisões”.
E explica que, na prática, isso pode acontecer de diferentes maneiras: através de humilhação, constrangimento, ameaça, manipulação, etc., ou “qualquer outro meio que lhe cause prejuízo à saúde psicológica e à autodeterminação”.
Segundo Marshall B. Rosenberg, psicólogo americano e pai da Comunicação Não Violenta, a violência tem sua origem na cultura de dominação e patriarcado, e não é apenas sobre “bater, espancar ou matar”. Negar sua parte de responsabilidade em uma situação que prejudicou o outro, comparar, julgar, rotular, generalizar, criticar, ignorar, não reconhecer e minimizar a dor do outro, como não reconhecer suas próprias necessidades e as do outro, são formas de violência.
Uma pesquisa mostrou que a violência psicológica é praticada independentemente do gênero na infância, enquanto, na idade adulta, as mulheres costumam representar a maioria das vítimas, principalmente em casos graves que foram denunciados.
Durante uma entrevista depois da briga, a aniversariante Maria Eduarda expressou e demonstrou necessidades psicológicas básicas de qualquer ser humano: respeito, autonomia, autoafirmação e reconhecimento. Disse que ficou “brava” com a atitude da irmã porque, daquela vez, queria apagar a vela sozinha e mostrar que tinha fôlego o suficiente.
É logico que nada justifica a violência física, mas é importante que os pais demonstrem empatia e compreensão em relação ao sentimento de ira e às necessidades que não foram atendidas, ao mesmo tempo que ensinam à criança não agredir fisicamente. Se uma deve pedir desculpas pelo puxão de cabelo, a outra deve também pedir desculpas por ter apagado a vela do aniversário dela.
Ou seja, na minha opinião, a violência psicológica é tão grave quanto a física e não pode ser ignorada ou minimizada. É preciso aprender a identificá-la e não tolerá-la desde a pequena infância.