Enquanto escrevo este texto, uma mulher está sendo violentada no Brasil. Neste período de quarentena, devido à pandemia do novo coronavírus, tenho visto um crescimento muito significativo da violência contra as mulheres. Muitas, neste exato momento, estão “trancadas” com seu agressor. Por isso, há urgência no combate ao vírus da violência contra a mulher, e não podemos fechar os olhos para um mal que vem infectando e destruindo nossas famílias há anos.
Falar sobre a violência contra a mulher ainda é um tabu na nossa sociedade; infelizmente, por muitas vezes, as vítimas são mais julgadas que seus agressores. A mulher que sofre violência física, psicológica, sexual, moral ou patrimonial precisa de apoio para quebrar o ciclo perigoso e vicioso da violência doméstica, que se divide em três cíclicos estágios: Estágio 1: Tensão (humilhações, ofensas e provocações); Estágio 2: Explosão (sexo forçado, tapas e socos); por último, e não menos importante, Estágio 3: Lua de mel (juras de amor, pedidos de desculpas, promessas e presentes).
O abusador, não por acaso, busca por mulheres em situações de vulnerabilidades emocionais, com pouco autoconhecimento, amor-próprio, e despreparadas para entrar ou estar em um relacionamento. A mulher com baixa autoestima, de início, já aceita menos do que ela merece.
Neste período de quarentena, estou em incansável atividade, fazendo “lives” com juízas, promotoras, delegadas, psicólogas, assistentes sociais e com pessoas voluntárias que se dedicam a ajudar outras mulheres em situações de vulnerabilidade, levando alimentos, informações e apoio neste momento tão delicado.
Se pararmos para pensar, desde pequenas, nas nossas primeiras instituições “família e escola”, somos pouco incentivadas a nos conhecer e a lidar com nossas emoções. E o comportamento agressivo parte de alguém que também não aprendeu a se conhecer e entender suas emoções, um ser totalmente despreparado para amar e ser amado.
A falta de amor-próprio atinge uma parcela muito alta da população e de forma ainda velada; não escolhe grau de escolaridade, condição financeira ou idade. Qualquer uma de nós pode, um dia, ser uma vítima dessa falta de valor próprio, mesmo sendo criada numa família bem estruturada, como eu tive o privilégio de ser. Por um intenso ano, fui vítima desse relacionamento tóxico e doentio, em que vivenciei humilhações, maus-tratos e abusos.
Cheguei ao fundo do poço, ao ter uma arma apontada para a minha cabeça, dentro de um carro em plena Avenida Paulista, pelo meu próprio namorado, a pessoa que dizia me “amar” mais do que eu a mim mesma! Por sorte, não morri, mas entendi que eu precisava ser forte para quebrar esse ciclo tão vicioso que estava me levando para o fim de toda mulher que não consegue quebrá-lo: o feminicídio. Eu não merecia aquilo, nem ninguém, principalmente, nenhuma mulher merece esse fim.
Ressignifiquei toda a minha vida e história e descobri que ela tinha muito valor, quando principalmente compartilhada para ajudar outras mulheres. Em 2014, lancei o “Help in love”, meu canal virtual, onde escrevo e ajudo meninas e mulheres a se entenderem e a buscar soluções inteligentes para seus relacionamentos amorosos.
Em cinco anos de aconselhamentos, foram mais de 60 mil pedidos de ajuda por e-mail, onde identifiquei que uma das maiores causas de relacionamentos abusivos era a falta de amor-próprio, que considero um grande agente transformador e protetor. Foi aí que decidi escrever meu primeiro livro, “Desafio do Amor- próprio”, um manual prático para se chegar ao autoconhecimento de uma forma leve, para mulheres de todas as idades.
Desenvolvi um olhar prático de sonoridade para ajudá-las a também quebrar esse árduo ciclo. Afinal, como cito no meu livro, “quem não tem amor-próprio, não tem amor pra dar”! Todas nós merecemos nos imunizar desse vírus. Busque conhecer-se, priorizar-se e, principalmente, amar-se!
Michele Pin é escritora, jornalista e ativista no combate à violência contra a mulher. Autora do livro “Desafio do amor-próprio”, Madrinha da SUBPM-RJ (Subsecretaria de Políticas para a Mulher) e da DEAM – Centro (Delegacia da Mulher). Casada com o empresário João Paulo Magalhães Lins, é mãe da Bella Maria, de 2 anos.