O problema da contaminação por esgoto do ponto de captação da estação do Guandu não é novo. Eu, particularmente, tenho denunciado esse assunto desde 1999, portanto, 21 anos de intervalo e, até agora, tudo igual e piorando.
A solução da transposição dos três valões de esgoto que contaminam o ponto de captação, sem dúvida, é um “quebra-galho” emergencial — o correto, obviamente, seria que os municípios poluidores da bacia hidrográfica local tivessem saneamento desde sempre. No entanto, a operação para resgatar esses municípios da Idade Média, em termos de saneamento, segundo o que li na imprensa, será da ordem de r$ 1.4 bilhão num prazo envolvendo uma a duas décadas. Portanto, não será de uma hora para a outra que os recursos e o tempo irão resolver o assunto e resgatar a importância dessa estratégica bacia hidrográfica.
Destaco que o custo apresentado é “pouco” dinheiro se comparado ao R$ 1.6 bilhão “torrado” na reconstrução do Maracanã para a Copa da Alemanha 7x 1 Brasil — questão de prioridade de autoridades que vivem numa outra realidade, diferente da turma que fica do lado de cá da mesa, bebendo água proveniente do tratamento de esgoto.
No entanto, além do saneamento dos municípios (Seropédica, Queimados, Japeri e Nova Iguaçu), deveria estar claro que precisamos, obrigatoriamente, tomar algumas ações emergenciais que protejam o ponto de captação da estação do Guandu do aporte de esgoto e de suas nefastas consequências para a saúde de nove milhões de moradores. Afinal, a estação de tratamento do Guandu é uma estação de tratamento de água e não de esgoto, consequentemente, com limitações técnicas inerentes ao seu objetivo de criação!
Para quem duvida da emergência da situação, que leia as conclusões de recentíssimo estudo da Fiocruz, onde a referida instituição reafirma a gravidade da situação em matéria do site OECO intitulada: “Fiocruz atesta presença de cianobactérias potencialmente tóxicas no Guandu“.
A ação emergencial, seja ela qual for, ao gosto desse ou daquele especialista de plantão, com o objetivo de melhorar as condições do ponto de captação, não exclui, de forma alguma, as mais do que necessárias medidas de médio a longo prazo visando resgatar a bacia hidrográfica local de seu destino de latrina.
Lembro-me bem de outros casos em que a hipotética, utópica busca do ideal, das exigências legais sem fim, conduziu ao agravamento da situação ambiental que, até hoje, só faz piorar. Querem exemplos? Pois bem, o primeiro remonta aos anos 80 do século passado e diz respeito ao saneamento da Baixada de Jacarepaguá, que se arrasta desde aquela década, sem previsão de execução completa em pleno século XXI.
A segunda diz respeito à recuperação das lagoas de Jacarepaguá, que constituía o legado olímpico de 2012, que ficou no papel, como de praxe, por inúmeras exigências que, na prática, não trouxeram qualquer melhoria prática para o quadro ambiental caótico e terminal das lagoas.
Diante desse contexto amplamente conhecido publicamente, e mais do que desfavorável para o ambiente e a saúde pública de nove milhões de habitantes da Região Metropolitana do Rio, sugiro aos representantes do Ministério Público do estado do Rio de Janeiro que pensem bem no que irão questionar sobre a proposta da transposição dos três valões de esgoto que a estatal CEDAE pretende teoricamente fazer para melhorar as condições das águas na estação do Guandu.
Reitero que venho denunciando a situação de contaminação do Guandu desde 1999, sem que algo de prático tenha sido feito efetivamente por quem quer que seja, evidenciando, no meu ponto de vista, uma omissão sistêmica diante do denunciado.
Na minha opinião, o que deveria já ter acontecido é a celebração de um termo de ajuste de conduta entre o MPE e a CEDAE, levando em conta ações emergenciais, visando proteger, melhorar as condições das águas no ponto de captação da estação do Guandu, bem como medidas estruturantes de médio e longo prazo, visando resgatar a importância de toda a bacia hidrográfica local.
Caso não prevaleça um mínimo de bom senso e realismo diante do monstro que estamos alimentando há décadas, não tenho dúvidas de que seremos engolidos por ele. Enquanto isso, continuo comprando água mineral!