“O Velo-City desandou”, afirma o carioca Raphael Pazos, 43, empresário de hotelaria, ciclista há 20 anos e criador da Comissão de Segurança do Ciclismo da Cidade do Rio (CSC-RJ) – fundada há 5 anos, com o objetivo de cobrar a aplicação das leis de trânsito, educar e conscientizar. Ele é um dos revoltados com a primeira edição sul-americana da maior conferência do mundo sobre mobilidade por meio de bicicletas, que acontece no Rio até esta sexta-feira (15/06). Raphael é um dos apoiadores do protesto simbólico “Velo-City” para quem?”, que vai acontecer nesta quarta-feira (13/06), durante a “Bike Parade”, dentro da programação do Velo-City, a partir das 10h no Píer Mauá. “Os ciclistas que deveriam participar não estão lá, mesmo porque o valor mais barato para a inscrição custa US$ 270 (aproximadamente R$ 1.000), mais que um salário mínimo, ou seja, quem vive a realidade pedalando nas ruas do Rio está excluído”, diz Raphael.
No ano passado, durante o mesmo evento na Holanda, Marcelo Crivella prometeu muito: disse que o Rio estaria preparado para receber o evento e haveria destinação de verba para criar novas ciclovias e fazer manutenção das existentes. No entanto, apesar de ter a maior rede cicloviária do Brasil, com 450 quilômetros de extensão, a cidade deixou de investir no sistema: nenhum novo trecho foi construído desde o início de 2017. Nessa segunda-feira (11/06), a Secretaria de Conservação e Meio Ambiente admitiu que o município não investiu em novas vias este ano, mas informou que espera a liberação de R$ 1 milhão para começar as obras de implantação de 3,2 quilômetros de ciclovia e de faixa compartilhada em Sepetiba.
O que o Velo-City vai deixar para a cidade?
A Velo-City não vai deixar nada. Quando Crivella ficou sabendo do Velo-City queria até cancelar, só não fez isso pela multa que seria absurda. Mesmo que o evento fosse inclusivo e gratuito, teria outro problema: o público-alvo não foi atingido. Foi uma bela oportunidade de melhoria jogada fora. O evento foi contratado na época do Paes, em 2016, e estava na pasta da Secretaria de Transporte. Quando o governo mudou, o Crivella passou a pasta da Riotur, como se fosse um evento turístico, ou seja, pensando que geraria receita para a cidade – em hotelaria, no comércio, como vitrine. Mesmo sabendo disso, o prefeito não fez nada, não construiu vias e não conservou as existentes. Tudo lindo e maravilhoso, mas utópico, porque os ciclistas não estão sendo ouvidos. É um evento para inglês ver.
Crivella disse na abertura do evento que é “apaixonado pela bicicleta”. O que acha disso?
Ele nunca fez nada pelas ciclovias e não acredito que a bicicleta esteja nos planos da prefeitura.
Quem pagou os US$ 270 para a inscrição do Velo-City?
As pessoas das delegações internacionais, provavelmente. O pessoal da União Ciclística Internacional (UCI), mas é para falar sobre como a bicicleta é boa para a economia, meio-ambiente, saúde, discursos para provar ao governo que ele pode ter retorno. Em Copacabana são 19 mil entregas por dia feitas por bike. Imagina a quantidade de ICMS que está circulando, o desafogamento de trânsito? Então estamos tentando convencer o governo a investir em ciclovias, mas nada acontece.
Quais as alternativas para a violência no trânsito?
A gente trabalha muito com educação no trânsito para as crianças, esperando que elas vão crescer conscientes dos seus deveres no trânsito, seja motorista, ciclista ou pedestre. E as campanhas são para os adultos, que não são educados, mas conscientizados. Eles só aprendem quando sentem no bolso ou perdem alguém da família.
Como mobilizar o poder público?
Bicicleta é um tema que envolve todas as secretarias municipais: de Conservação e Meio-ambiente, de Obras, de Esporte, Transporte, Riotur… Esse tema deveria estar muito bem azeitado entre todas as secretarias, porque não adianta a de obras fazer uma reforma e não ter a conservação, a exemplo da ciclovia Niemeyer, que está toda deteriorada. Nosso trabalho é ajudar ao poder público a entender isso e nos atender. Quem está lá não entende tudo, então começamos a fazer esse trabalho e criamos uma parceria na época da gestão do Eduardo Paes e agora do Crivella. Nossa comissão é apartidária, mas existe diferença com relação ao Paes – ele sempre atendia aos nossos pedidos, já com o Crivella, não conseguimos nada.