Humor é com ele mesmo, mas, desta vez, Aloisio de Abreu vai colocar mais amor na vida das pessoas, com o espetáculo “AloisioFrankSinatradeAbreu”, a partir da próxima sexta-feira (24/11), no teatro Laura Alvim, em Ipanema. Como diz o título, o artista vai interpretar músicas de um dos mais populares e influentes artistas do século XX. “Vai ser um decálogo sobre o amor. Vou atravessar o verão carioca no palco. Criei o horário de 17h para as pessoas chegarem tranquilas, tomarem um vinho, entrarem louconas e cantarem junto… É muito inimista e vou cantar praticamente no colo das pessoas”, diz ele, que será acompanhado pelo piano do parceiro de trabalho André Poyart. Algo em comum com Sinatra? “A data de aniversário, 12 de dezembro, e o mesmo registro vocal”. Boa!
No palco, Aloisio vai aparecer “na beca”, num figurino escolhido por Lessa de Lacerda: “Ele me colocou lindão, com a autoestima lá em cima. Uso uma calça e paletó de tecido tropical inglês e uma camisa de algodão 600 fios egípcios, além do chapéu totalmente Sinatra”. Aloisio vai homenagear a amiga Márcia Cabrita, com quem dividiu o palco por 22 anos no bem-sucedido espetáculo “Subversões”. A atriz morreu no último dia 10: “Foi um golpe. Vou fazer uma homenagem a ela no show antes de cantar ‘My Way’”, avisa ele. (Foto de Guga Melgar)
Como surgiu a ideia do espetáculo?
Estava pensando em fazer um tributo a um cantor com quem eu tivesse afinidade e o mesmo registro vocal, além de um repertório com que eu me identificasse. Pensei em Orlando Silva, mas o Tuca Andrada já faz maravilhosamente bem; no Cauby (Peixoto), mas o Diogo (Vilela) é um “cavalo” incrível (na Umbanda é como se fosse o ‘médium incorporado’). Nesse ínterim, do nada, sonhei com o Frank. Apareceu. Eu tenho a biografia dele e peguei para reler. Descobri que nascemos no mesmo dia e, em algumas músicas, cantamos no mesmo registro vocal. Era um sinal.
E a seleção das músicas?
São 10 músicas sobre as temperaturas do amor – a paixão, o término, a fantasia, o amor próprio, o amor pelo outro, a amizade… Fiquei bem atento na identificação das letras que tenham a ver com a minha têmpera de artista. Ele era cantor e atuava; eu sou ator e canto. As que eu mais gosto são “Fly me to the Moon”, “I’ve Got You Under My Skin”, “That’s life” e “I’m Gonna Live Till I Die”.
Vai ter o habitual humor sagaz?
Vou fazer com muita alma e no espírito de cantor romântico, mas tem uma sacanagem ali. Vou pegar a época do “Rat Pack” de Las Vegas (apelido de um grupo de artistas populares muito ativo entre a década de 50 e 60), o lado mais boêmio e pegador. Vou conversar muito com o público e falar de coisas que todo mundo viveu, ou não, ou gostaria de viver, daquele amor de pica, que, quando bate, fica, com forte conotação sexual; mas naquela época era mais chique, elegante… A pegação não era “na boquinha da garrafa”, mas “strangers in the night”, uma sedução com coração acelerado.
Está faltando amor nas pessoas?
Estamos vivendo um momento de selvageria histórica e histérica, principalmente com a cultura. Hoje em dia é um ato de resistência fazer um espetáculo, seja ele reflexivo, que desperte uma consciência política, poético ou uma comédia rasgada. O importante é produzir entretenimento porque todo mundo está demonizando a cultura como se fosse um artigo de luxo. Temos dois “Brasis”: um, chamado Brasília, que é o Congresso, feito para eles, e o feito para a gente, que se fode para pagar as contas, vive no cheque especial, e para pagar quem trabalha com a gente, porque nós também empregamos, e eles não enxergam isso. Cultura é a identidade de um povo. Amor é fundamental, um levante contra a idolatria ao ódio.
O País está careta?
O politicamente correto dificulta muito para nós, que trabalhamos com comédia. Não sou a favor de fazer piada com o lado mais fraco; não é bacana falar de negro ou homossexual sem propriedade. Mas vivemos num país em que a apropriação cultural é cotidiana – temos a miscigenação no sangue. Temos rappers brancos catando samba, sambistas que são brancos – isso é uma apropriação cultural. Mas vou fazer igual à Glória Pires no Oscar, “não me sinto preparado para opinar”.
Você sofreu algum preconceito por ser gay?
Nunca sofri nenhum ataque homofóbico frontal, mas eu era muito reprimido na juventude e tinha problemas com minha homossexualidade. Depois de muita análise, aceitação da família, me soltei. Mas sempre me incomodou demais ver garotas homossexuais serem maltratadas, travestis nas calçadas… A homofobia é inaceitável.
Está solteiro?
Estou na ventania, mas tô aí pra jogo. Aqui não tem portas fechadas, não.
Algum recado para o prefeito do Rio?
Nasci em Resende (município carioca), mas me mudei para o Rio com 1 mês de idade e moro em Ipanema desde que me conheço por gente. Acho o Rio maravilhoso. Não me canso, não sou daqueles que vão embora só porque a cidade está abandonada, um lixo. Ipanema só tem farmácia e banco, o charme está opaco, mas continuo achando maravilhoso. Mas prefeito, cadê Vossa Excelência? Quem é? Como se veste? Por onde anda? Não vejo o prefeito na cidade. Violência tem no mundo inteiro, mas a Polícia Militar está maltratada. Como eles vão cuidar da gente se o governo não cuida deles? A relação é tensa entre população-governo-PM, um triângulo desamoroso. Eles precisam ser bem pagos para ter uma empatia com a população. A PM não pode morrer que nem mosca e ficar matando cidadão porque mora em comunidade. É um assunto delicado.