Marco Antonio Coutinho Jorge, um dos maiores psicanalistas do País, professor do Programa de Pós-graduação em Psicanálise da UERJ, diretor do Corpo Freudiano do Rio, membro da Sociedade Internacional de História da Psiquiatria e da Psicanálise (Paris) – e vamos parar por aqui porque não caberia no ‘saite’ –, está em Paris, onde dará uma série de palestras na Maison de l’Argentine, até este sábado (21/10).
Marco conversou com a coluna para contar que está finalizando um livro, em quatro mãos com a colega Natália Travassos, sobre transexualidade, tema de uma de suas palestras, “La Transexualité à l’ére de la science et de la mondialisation” (em tradução livre, “A transexualidade na era da ciência e da globalização”). “O livro será dedicado ao público leigo com o objetivo de transmitir alguns pontos essenciais a partir da perspectiva psicanalítica. O tema tem sido abordado de forma muito superficial pela cultura, sem levar em conta as dimensões da fantasia inconsciente e da identificação”, diz ele à coluna.
Assunto saturado, principalmente depois de a novela “A Força do Querer” incluir a personagem Ivan/Ivana (Carol Duarte), que faz a transição de gênero, o psicanalista nunca assistiu a um capítulo. “Não acompanhei, mas escutei os ecos da trama. Os efeitos são positivos porque é salutar falar sobre sexualidade com abertura e sem preconceito, de modo a oferecer às pessoas condições de compreensão dos aspectos da sexualidade (homossexualidade, bissexualidade, transexualidade) que estão na origem de reações extremamente violentas na nossa cultura. Mas isso é apenas o início de uma longa conversa, e, para isso, a psicanálise precisa ser introduzida”, alerta.
Jorge também destaca uma curiosidade presenciada em suas palestras: “Os trans precisam entender que não existe complementaridade entre os sexos biológicos; a apologia da heteronormatividade é efeito da neurose e do recalque. Assim como Freud assinou manifestos a favor da descriminalização da homossexualidade e da liberação feminina, Lacan afirmou que ‘ninguém autoriza a sexualidade de ninguém'”, diz.
De acordo com Marco, o assunto é preocupante quando trata-se de mudanças corporais: “O problema é a maneira em como a ciência vem respondendo às demandas de transformação corporal sem hesitação ou questionamento. Nesse caso, o papel da mídia pode ser altamente negativo ao se tornar o mais eficaz porta-voz da banalização da ciência. Trata-se de um assunto que requer toda a cautela, pois estão em jogo cirurgias irreversíveis e alterações hormonais cujos efeitos precisam ser cuidadosamente avaliados.”