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Marcia Tiburi é uma filósofa contemporânea: faz críticas veementes ao que não concorda, tem fortes opiniões sobre o que considera correto, respeita a opinião do outro, vê na alegria uma forma de revolução, foge da chatice cotidiana e sabe ensinar Filosofia de maneira prática e, ainda assim, bastante reflexiva. Atualmente professora do programa de pós-graduação em Educação, Arte e História da Cultura da Universidade Mackenzie, em São Paulo, e colunista da revista Cult, Márcia ainda dá cursos e palestras Brasil afora. Nos tempos livres, pinta: a escritora é também formada em artes plásticas.
Márcia tem uma filha adolescente, Maria Luiza – de quem é pai e mãe, mas não vê problemas nas tantas coisas a fazer por dia: é uma feminista assumida, cheia de argumentos a favor disso.
Em 2005, foi uma das apresentadoras do programa “Saia Justa”, da GNT, o que durou por cinco anos. Como na TV, quando Tiburi começa a falar, fica difícil prestar atenção a qualquer outra coisa que não seja ela. Mas, sempre com a ‘lente filosófica’ ligada, foi de onde tirou inspiração para o livro “Olho de Vidro: A Televisão e o Estado de Exceção da Imagem” (Record). Ao contrário, sua relação com os livros é completamente prazerosa. Num país onde mais de 30 milhões de pessoas são analfabetas – óbvio que os dados reais são maiores que as estatísticas publicadas -, gostar de ler é considerado uma virtude, algo que deveria ser mais do que normal. Convidada para o #ficaadica, Tiburi dá ânimo, entusiasmo, para que você passe, quem sabe, a se interessar pelo assunto. Pode ser um começo de ano diferente!
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Não pensar dói
“Dizem que pensar dói. Não pensar dói mais ainda, garanto. E, pra pensar, ler é sempre um caminho seguro. Vamos começar sugerindo textos pra essas pessoas que dizem não gostar de ler (será que elas realmente existem? Sempre é bom a gente se questionar…). Recomendo começar lendo crônicas. Podem ser as de jornais, as publicadas em livros ou as que estão no site http://www.vidabreve.com/, onde escrevo às terças. Ali, outros cronistas também publicam as suas, entre eles, Rogério Pereira, Luís Henrique Pellanda, Humberto Werneck, Marcelo Moutinho. As crônicas sempre falam do cotidiano e servem de lentes de aumento contra a miopia nossa de cada dia. Pode ler muito, o quanto quiser, não vai fazer mal nenhum.”
Leitura de clássicos
“Para quem acha que ler os clássicos é fundamental (embora sempre se possa questionar essa ideia) e dispõe de bastante tempo para se concentrar (embora isso possa ser dolorido), sugiro o mesmo de sempre: “Irmãos Karamazov” de Fiódor Dostoiévski, o russo para quem “Se Deus não existe, tudo é permitido”. Tem boa tradução, feita por Paulo Bezerra para a Editora 34. Esse talvez provoque um pouco de desconforto, mas certo tipo de sofrimento, o intelectual, é curativo. Juro!”
Zulmira Ribeiro Tavares
“Quem já conhece literatura, ou não tem medo de aventuras, pode ir à estante de literatura brasileira contemporânea para se divertir com o livro de contos da paulistana Zulmira Ribeiro Tavares chamado “Região” (Ed. Companhia das Letras). Se já visitou a região dos Jardins, em São Paulo, vai achar impagável. Quem diz que mulheres não escrevem com humor não conhece a excelente, a invulgar dona Zulmira.”
Nietzsche: muito saudável
“Filosofia? Sério? Quer ler filosofia de verdade? Não tem medo de textos que vão virar você do avesso? Então, pode começar com Nietzsche. O filósofo alemão tem algo de vulcão, de copo de conhaque na madrugada, de surfar em ondas violentas. Nada suave, Nietzsche é filosofia de autotransformação. Bem lido, ou seja, lido para pensar na vida, na sociedade, na existência – e não apenas para se sentir mais culto – esse filósofo faz pensar e sentir – demais e tudo ao mesmo tempo. Recomendo, por exemplo, a Genealogia da Moral (e a edição da Cia. das Letras que é super bem traduzida). Mas aviso aos navegantes: não vá esperando afago nas suas ideias prévias, nem meros argumentos ou teorias explicativas do mundo. Vai sobrar pouca coisa se você for muito crente. Mas garanto que é muito saudável.”
Conviver com a angústia
“Na mesma linha, um livro alemão que ajuda a entender o Brasil: “Crítica da Razão Cínica” de Peter Sloterdijk (Ed. Estação Liberdade). Se demorar um ano lendo, aproveite pra descobrir que aprender a conviver com a angústia é o único remédio.”
“Deus, essa gostosa”
“Já que curtiu a desmistificação, aproveite e leia “Deus, essa gostosa”. É uma HQ com texto e desenhos de Rafael Campos Rocha (Ed. Companhia das Letras). Tipo: sem palavras.”
Ler pra esquecer
“Tem quem beba para esquecer, mas se for o caso de ler pra esquecer, Hilda Hilst, o livro “Rútilos” da Editora Globo. Alguém dirá, “mas esses contos são muito difíceis”; aí, com um pouco de ironia, eu recomendaria “O mendigo que sabia de cor os adágios de Erasmo de Rotterdam”, de Evandro Affonso Ferreira (Ed. Record), sugerindo ainda que “difícil” é um jeito muito fácil de ofender um escritor. E um leitor que se preze não fala um palavrão desses. Brincando, mas falando sério…”
“Amour”
“Se não quiser ler e preferir um cinema, veja “Amour”, de Michael Haneke. Finalmente, alguém não põe o amor em questão, antes nos dá a prova.”
Mude seu jeito de olhar
“Se não der pra sair de casa e ir ao cinema, vale o filme “O Homem ao Lado”, dos argentinos Mariano Cohn e Gastón Duprat. Para desmontar a ideia de que pessoas boazinhas e esteticamente corretas são éticas e decentes. Você vai mudar seu jeito de olhar os vizinhos, as revistas, as lojas de decoração…”
Fique longe dos mais vendidos
“Por fim, se as livrarias não fazem parte de seus passeios semanais, se for a primeira vez que você vai entrar em uma (ironia à parte, perdão, perdão…), por favor, fique longe da lista dos mais vendidos. Raramente um livro bom vai parar nesta lista. E quem não gosta de livros bons não gosta de si mesmo. Mas o que é, afinal, um livro bom? Um livro que me faz desconfiar de mim. A alma se descobre um pouco adiante…”