Sinto que nasci para ser monge.
O que me afasta da vida monástica é a religião.
Por que será que não há mosteiros ateus?
Seria fantástico me recolher a um local onde pudesse me dedicar apenas a cultuar Darwin, venerar Freud, reverenciar Nietzsche, e ler Dawkins e Hitchens sob a luz filtrada de uns vitrais, depois meditar sobre o Nada e louvar o Acaso por todas as maravilhas ao meu redor.
Acordar cedo, botar a roupa de hábito (bermuda e camiseta), tomar em silêncio um açaí com bastante granola e dirigir minhas orações (principais, coordenadas e subordinadas) ao Heliocentrismo, à Evolução das Espécies, à Seleção Natural, ao Gene Egoísta.
Nas manhãs de domingo, entoar à capella (ou, pelo menos, à galpão) Thelonius Monk (ou, se estiver nublado, Meredith Monk), sob o olhar cúmplice do Big Bang pintado na abóbada.
Outro problema dos mosteiros tradicionais é a falta de sexo.
Ou, pelo menos, de opções razoáveis.
Um mosteiro ateu não poderia ser somente homoafetivo, como em boa parte das ordens religiosas.
Não que fosse virar uma suruba (nada contra, imagina!), mas haveria lugar para todas as vocações sexuais — afinal, sexo não seria pecado. Poderia até ser um sacramento…
Como nos mosteiros religiosos, não trabalharíamos (no sentido capitalista de gerar riquezas materiais). Logo, teríamos uma atitude muito zen diante das questões trabalhistas e previdenciárias.
Cuidaríamos da limpeza das nossas celas (no caso, suítes), do claustro (envidraçado, com uma varandinha gurmê), cultivaríamos uma horta orgânica, produziríamos um vinho aceitável e um licor de jabuticaba de bebericar de joelhos.
A vida seria consagrada à dúvida.
Uma luta diária contra a tentação de dizer vai com Deus, se Deus quiser, sabe Deus quando, Deus me livre, graças a Deus, adeus e crendospai.
Um processo árduo de autocontrole para nunca mandar alguém ao diabo que o carregue, e, mesmo quando a coisa estiver como o diabo gosta, não querer que tudo o mais vá pro inferno e o diabo a quatro.
Teria isenção de impostos e viveria do dízimo dos infiéis.
Muito injusto não haver mosteiros ateus.
Eu teria a vida que pedi a Deus.