“Mamãe, avental sujo de ovo! Mamãe, mamãe, mamãe….” Pois é, a Teoria Psicanalítica se baseia na relação mãe e filho: ódio, confronto, mágoa…, mas também tem saudade, um cordão umbilical eterno, um companheirismo único… É o viés do afeto dessa relação única, ímpar, que Gabriel Chalita constrói “Sorriso de Mãe”, um monólogo que apresenta como se constrói esse laço inquebrantável, pelo diálogo com as diferentes vidas.
O personagem Cícero apresenta todos os sentimentos que conseguem transmitir o significado do próprio nome. Quem se chama Cícero é idealista e romântico, está sempre se sentindo bem em casa, com a família amigos ou em um relacionamento tranquilo e harmonioso. A interpretação de Joelson Ribeiro traça os mais vários comportamentos, sentimentos que personifica, com talento, o filho que é capaz de ver, no amor dos outros, o seu próprio amor.
A estrutura dramatúrgica escolhida por Chalita é muito interessante. Cícero está conversando com a mãe, Maria. Parece uma despedida, mas o tom não é de tristeza e vai relembrando encontros que tiveram em viagens, com amigos. As pessoas vão contando as suas histórias: o filho que ficou ausente, a mãe que tem dúvidas sobre aceitar a escolha da sexualidade, a amiga gulosa, o marido apaixonado pela mulher. Assim, a peça deixa de ser um monólogo e vira um mosaico de carinhos, composto por pessoas que encontramos em nosso cotidiano.
A direção do premiado Fernando Philbert é segura ao caracterizar os personagens seja pela prosódia, seja pelo sentimento dominante e, com isso, temos comédia, drama, paródia e realismo. Nesse sentido, Joelson cresce demais. Os sotaques (nordestino e mineiro) são de uma perfeição, sem esbarrar na caricatura. A exposição do amor do marido pela mulher em processo de demência, o jeito de Odete, a vizinha desesperadamente gulosa, internada no hospital mostram uma versatilidade rara, pois Joelson realiza os diferentes personagens no mergulho necessário para permitir que a plateia imagine qual o físico, quais as histórias anteriores e como será o final de cada um.
Chalita constrói os episódios com uma linguagem de frases curtas, porém intensa, com a repetição de pequenos “bordões”, para que fique muito clara a mensagem que está passando. “Sorriso de Mãe” é um pequeno álbum, daqueles que folheamos, paramos em cada foto, refletimos sobre o que vemos e o que não vemos, que são nossas próprias vidas — porque afinal, mãe é só uma.
Serviço:
Teatro dos Quatro (Shopping da Gávea)
Sexta e sábado, às 20h
Domingo, às 19h.