Todos nós falamos por pensamentos vagos, frases toscas, incompletas. Diálogos geralmente são de surdos – não se ouve o outro. Querer não é poder. E os encontros se dão pelo comum da humanidade: solidão, amor, desejo, procura, falta. É esse o viés geral com o qual a autora Sarah Kane, considerada a maior autora inglesa do século XX, constrói a sua dramaturgia no espetáculo “Crave ou ânsia”, em cartaz no Sesc Tijuca.
César Augusto, diretor e tradutor, consegue, com os quatro atores – Alexandre Galindo, Elisa Barbato, Maria Adélia e Rogério Freitas -, uma realização harmônica, a partir de filigranas. Não há trama, ação ou fio condutor que criem personagens e que se tenha fio condutor. Quatro pessoas em cena, sem nome, expõem seus sentimentos, despejando mesmo o que lhes vem à cabeça, sem censura e aparentemente sem lógica.
A peça contém vários temas sombrios, apresentados como questões que assombram os quatro personagens. Esses temas incluem estupro, incesto, pedofilia, anorexia, dependência de drogas, instabilidade mental, assassinato e suicídio. O sexo e o gênero dos quatro caracteres (A, B, C e M) só são identificáveis a partir do contexto dentro da peça
Como a construção dramatúrgica, centrada no diálogo, é intertextual, torna-se necessário que o trabalho da direção seja capaz de unir aquilo que aparentemente não tem nexo. A autora não fornece contexto, instruções de palco ou descrições de personagens. É no trabalho de César Augusto que fica claro como a autoria vai além de quem escreve – está no artista sensível que é capaz de transformar a ânsia da autora, mas que é de todos nós.
Fotos: Fernanda Portella
Serviço:
Sesc Tijuca
De sexta a domingo às 20 horas