Carla Benchimol, suíço-ítalo-brasileira, porém muito carioca, formada em Administração de Empresas, mas sem se dedicar, por passar parte do seu tempo também na Suíça, é casada com o cardiologista Cláudio Benchimol há 22 anos, professor-adjunto da UFRJ e da UERJ.
Como muitas mulheres de médicos devotados à profissão, ela viu sua vida passar por grande mudança desde o começo da pandemia, por ter o marido entre os que atuam na linha de frente da Covid-19. Vem convivendo com ele muito menos do que o habitual. Talvez pelo medo dobrado de se intoxicar em casa ou na rua com essa involuntária proximidade com o coronavírus, autocondenou-se a uma quarentena rigorosa: “O meu lado da pandemia foi e está sendo solitário e difícil, um longo e ansioso caminho. Eu escolhi a reclusão total talvez por ver tão de perto tudo que está acontecendo”, diz ela.
O que significa ser casada com médico da linha de frente da covid?
Significa que pouco vejo meu marido desde o início da pandemia. É também uma preocupação diária com proteção, com o cansaço, e com as poucas horas de sono. Desde que tudo começou, Cláudio, como grande apaixonado por medicina que sempre foi, tem se dedicado de corpo e alma, enfrentando hospitais cheios e ambientes infectados diariamente.
Passado mais de um ano do começo da pandemia, a gente se acostuma?
Não, continuo a mesma desde o primeiro dia. Claro que a chegada da vacina nos fez ter uma luz no fim do túnel, mas ainda existe um longo caminho a ser percorrido.
Ainda que não atuando, acaba que mulher de médico tem um papel importante?
Estou aqui pra isso, e a cada morte, cada história triste, eu sinto um aperto no coração, como se fosse comigo. E quando a noticia é boa, eu vibro da mesma forma e agradeço muito. Médicos são heróis, mas mulheres de médicos também têm o seu papel. Escuto dele o que não vejo, e isso é assustador.
Existem vantagens e desvantagens de ter um marido longe em algumas situações? Mais ainda em relacionamentos longos, que é o seu caso, ou muito pelo contrário?
Sou casada há 22 anos, e desde o primeiro dia eu sabia que a paixão do Cláudio pela medicina era uma realidade. Acho que a medicina só perde para mim no coração dele. Já estou acostumada à rotina, aos telefonemas no meio da madrugada, mas nada disso me incomoda. Sempre fomos muito amigos, confidentes e próximos. Isso não mudou.
Você tem cachorro. Os cães, neste momento, são os melhores amigos da mulher?
Não vejo ninguém, não saio. Só me arrumo para fazer vídeos bobos para o instagram, quase sempre, com participação especial da Vita (sua cachorra). Como diz minha mãe, os palhaços são sempre os mais tristes. Me sinto deprimida, mas sei que tudo vai melhorar. Vita foi, sem dúvida, minha melhor companhia. Só espero não perder minhas amigas! Não desistam de mim por favor!
Numa época em que os dias parecem todos iguais, passar muito tempo só e ainda confinada é mais um desafio ou um aprendizado?
Sempre fui caseira. Ficar em casa não foi e nunca será um desafio para mim; é um aprendizado, com certeza. Infelizmente, nada de bom até o momento. Tenho ‘estudado’ o ser humano e suas atitudes, e não tenho gostado das minhas conclusões. No mais, espero cada dia o barulho da chave na porta, e agradeço por ele ter chegado bem, em casa. Amanhã é outro dia…..e assim vivemos, um dia de cada vez.
Temos quase um ano e meio de pandemia, você vem aceitando bem?
Aceito esta vida porque a causa é nobre, heroica, e só me faz sentir mais orgulho do meu marido a cada dia que passa, por ele ter encarado, sem medo, este filme de terror que estamos vivendo, no qual somos meros personagens sem saber o final.