
A tragédia de Petrópolis, depois da chuva que caiu nessa terça (15/02) /Foto: Reprodução
Algumas sociedades aprendem com seus erros e prosperam; outras insistem nos mesmos erros e sucumbem. Já aconteceu antes e continuará acontecendo; agora é a vez, novamente, de Petrópolis.
Muita comoção, como não poderia deixar de ser, muita cobrança do que deveria ter sido feito, e não se fez — avaliação do motivo de não ter sido usado todo o dinheiro voltado para o combate desse tipo de situação, cada vez mais recorrente diante do novo normal climático. Análises dos “experts” disso e daquilo, com sugestões e indicações do que precisa ser feito. Centenas de mortos, dor, tristeza, desesperança e por aí… O script desse filme de terror, quem é brasileiro e principalmente carioca, já conhece desde que nasce.

Não mudam as causas históricas das tragédias. Mudam apenas o nome dos mortos, o nome dos responsáveis, alguns até que se repetem eleição depois de eleição, mas sem maiores consequências para os mesmos e provavelmente o número crescente de mortos que diante de uma Natureza, naturalmente politicamente incorreta, não tem pena do que e de quem estiver no lugar e na hora errada /Foto: OlhoVerde
Fato é que, em um ou dois meses, a atual catástrofe — fruto da omissão, impunidade, falta de gestão e resiliência patológica da sociedade, características da cultura local, mais esse extermínio de vidas — estará apenas na memória de quem perdeu tudo, nas estatísticas, imagens de arquivo e livros de História.

Morro do Bumba, em Niterói, em 2010. O que mudou? O local, o nome dos mortos e dos culpados que geralmente nunca são punidos /Foto: OlhoVerde
Culpados não serão identificados, pois, nesse lugar, filho feio não tem pai tampouco mãe. Os crimes ambientais e sociais nascem do nada, e simplesmente não acontece nenhuma consequência para quem gerou e continua gerando todas as condições para que bombas-relógio sociais e ambientais continuem se multiplicando e explodindo por toda parte.
Assim tem sido o Brasil e a forma que se encara o que acontece por aqui, com a famosa e resignada frase: “Foi Deus que quis.”
Lembro especialmente das chuvas de 1988, 1996, 2002, em seguida das de 2010, 2011 e, mais recentemente, em 2019. O que mudou de lá pra cá, sem falar naquelas de 1966, quando eu tinha apenas dois anos de nascido neste planeta?
O país, desde 1966, cresceu economicamente e, junto dele, o PIB, acompanhado das mazelas sociais relacionadas especificamente à falta de moradia para as classes sociais menos favorecidas, gerando uma metástase sem horizonte de fim no tecido urbano e ambiental de praticamente todas as cidades.

Santa Teresa, em 2010 /Foto: OlhoVerde
Passamos por várias fases de mania (euforia) e depressão sem que a questão habitacional fosse encarada de forma permanente e urgente. Afinal, somos uma economia e sociedade “bipolar”, de altos e baixos, muitos baixos, em que, recentemente, gastaram-se dezenas de bilhões de dólares em eventos faraônicos sem que o básico tivesse sido resolvido — típica mania nacional!
Em resumo, não há como reverter de fato essa situação, senão com uma massa social crítica atuante que pressione a classe política no sentido de gerir, de fato, a massa falida habitacional, buscando soluções técnicas perenes para o tema. Pressione o Judiciário para que julgue e puna os culpados de tão numerosas e repetidas tragédias, e o Legislativo produza leis que gerem punições exemplares aos delinquentes que produzem dentro e fora do poder público tamanho extermínio de vidas. Fora isso, não há como reverter esse caos em que nos afundamos ano após ano, eleição após eleição, chuva após chuva.

O que mudou no sistema lagunar de Jacarepaguá desde 2010? Inundação do condomínio da Aeronáutica pelas águas da lagoa de Jacarepaguá /Foto: OlhoVerde
Aí ficam as questões objetivas em alguns casos:
No que deu a tragédia da Cidade de Deus (1996)?
No que deu a tragédia do Areal, em Angra dos Reis (2002)?
No que deu a tragédia do Morro do Bumba, em Niterói (2010)?
No que deu a tragédia de Santa Teresa (2010)?
No que deu a tragédia da Região Serrana (2011)?
No que deu a tragédia da Muzema (2019)?
No que vai dar a tragédia de Petrópolis (2022)?
Salvo engano, na maioria dos casos, não deu em nada para quem deveria responder pela ocupação urbana desordenada, que torna ainda mais vulneráveis áreas ambientais, naturalmente já vulneráveis a escorregamentos e inundações.
Sem educação de qualidade e sem massa crítica, não há chance de mudar essa história terrível e repetitiva.
Pessoalmente, tenho certeza de que essa série de terror, não tem data para acabar e infelizmente, de forma cada vez mais sistemática, veremos o resultado de todos os nossos erros sendo cobrados cada vez mais caro por quem desconhece o politicamente correto: a Natureza.