A chef paulistana Janaína Torres (sobrenome de solteira), a “Dona Onça”, acaba de ser eleita a melhor chef mulher do mundo pelo “50 Best”, importante prêmio da gastronomia. Os vencedores serão conhecidos em cerimônia no Wynn Las Vegas, no dia 5 de junho de 2023. “Ainda estou me alimentando de toda a energia vibrante que recebi. Estava embarcando para a Guatemala (sul do México), quando chegou a notícia. Foram mil mensagens — cada uma que eu lia, chorava e achavam, ao meu redor, que eu estava com dor. Sim, era uma dor no peito tão grande, mas de felicidade, um turbilhão de emoções que nunca tinha sentido antes. Não imaginava ser tão amada”, disse ela sobre o título.
No entanto, pode-se dizer que as premiações não são novidade em sua vida: em 2023, ganhou, como a melhor chef mulher da América Latina, pelo mesmo “50 Best” e, em 2019, lá estava ela, entre os 50 melhores do mundo.
Trecho do texto da premiação: “Janaína Torres é um fenômeno multitarefa. Ela não apenas lidera A Casa do Porco como também supervisiona uma série de outros locais, além de fazer campanha sobre questões, tais como: educação alimentar, acessibilidade aos restaurantes e inclusão social. Ela trabalhou como voluntária na criação do ‘Cozinheiros pela Educação’, a convite do Governo do Estado de São Paulo, em projeto que incluiu aulas com as cozinheiras da rede pública. Desde junho de 2021, é presidente do Instituto Brasil a Gosto, fundado em 2006 pela empresária Ana Luíza Trajano”.
Janaína é paulista-raiz, nascida e criada num cortiço no Brás, onde mantém cinco restaurantes, no entanto, seu perfil, por exemplo, se encaixaria muito bem numa Lapa — ela ama o Rio e, sempre que vem a trabalho, os ingressos se esgotam, sem falar que existe a torcida em tê-la na cidade.
Além da Dona Onça e de A Casa do Porco (em sociedade com o ex-marido, Jefferson Rueda, com quem foi casada por mais de 20 anos), tem ainda a lanchonete de cachorro-quente Hot Pork, a Sorveteria do Centro, a Merenda da Cidade, o Sítio Rueda e o Açougue Porco Real.
Em 2022, Janaína passou por uma espécie de luto, depois de descobrir a traição do marido. Em seguida, veio o renascimento: fez uma plástica nos seios, tatuou o braço esquerdo com a pelagem de onça e tem conquistado um título depois do outro. Além da cozinha e dos projetos sociais, seu maior amor são os filhos, João Pedro e Joaquim José, de 17 e 14 anos. “Eles são o meu maior prêmio”, declara ela.
UMA LOUCURA: Abrir um restaurante.
UMA ROUBADA: Estar em qualquer lugar com gente chata. Meu padrinho, Júlio César Toledo Piza (1939-2020, ex-presidente da BM&F e sócio no Bar da Dona Onça), me dizia que ‘chato não serve nem pra ir pro céu — chega lá e cumprimenta o santo errado’. E também almoçar com pessoas sem conteúdo de conversa.
UMA IDEIA FIXA: Ver meus filhos encaminhados, educados, sem desrespeitar o próximo, serem leais aos seus, seguros e ajudarem ao redor. Eles estão se tornando homens de verdade, trabalhadores, lutadores, confiantes, confidentes, homens de caráter, de respeito. Acordo todos os dias pensando nisso e, claro, na saúde deles.
UM PORRE: Num restaurante japonês na Liberdade, ainda estando de carro, fui dar ré: enfiei o porta-malas no poste. Foi quando percebi que deveria não ter mais carro. Por 20 anos, fiquei sem dirigir; voltei há dois anos. Teve um porre também no antigo Bar do Maranhão, no Bixiga.
UMA FRUSTRAÇÃO: Ainda não ter conseguido convencer os políticos do Brasil de que a alimentação deve estar no currículo disciplinar regular de todas as escolas públicas. Em 2016, começou o projeto Cozinheiros pela Educação, para reformular os cardápios da merenda escolar estaduais, com pratos inspirados na culinária paulista e feitos com alimentos naturais, abandonando o uso de produtos ultraprocessados. Foram treinados mais de 1.800 cozinheiras; saiu em 2019, quando houve uma transição de secretaria. Outra frustração é não conseguir ajudar alguém, seja quem for, a sair do uso de drogas.
UM APAGÃO: Os apagões foram tantos que eu nem lembro (rsrsrsr).
UMA SÍNDROME: Levar meu cobertor pra viajar, pra ficar cheirando, senão não consigo dormir. Depois da minha separação, deparei com a síndrome de não acreditar na lealdade e na fidelidade masculinas. Vou precisar me tratar em relação a isso.
UM MEDO: Medo de ver meus filhos doentes e de fazer falta para eles; de ver o mundo se destruindo; ver crianças doentes sem comida, sem orientação, sem um porto seguro; de adoecer e sofrer; de morrer e não ver mais a beleza deste mundo.
UM DEFEITO: Querer fazer muito rápido as coisas, muitas vezes, não dependendo só de mim. Eu começo a ficar incomodada. Trabalhar a paciência será sempre a minha missão comigo.
UM DESPRAZER: Desprazer foi ter visto a traição de perto, a deslealdade brutal. Nada na vida pode nos dar mais desprazer do que isso.
UM INSUCESSO: Não falar inglês (ainda). Mas hoje penso que todos os insucessos que pensamos ser são, na verdade, o elo para o tal sucesso. Tudo, tudo, tudo que acontece nesta vida te leva ao encontro da tua energia e àquilo que desejas ser e fazer.
UM IMPULSO: Abrir novos negócios, comprar utensílios de cozinha que sempre um dia me servem para fazer algo. Compro sem saber pra que, mas logo encontro sua utilidade.
UMA PARANOIA: Tenho a paranoia de desconfiar da fidelidade masculina, de deparar novamente com a deslealdade e as traições da vida. Isso só a vida me mostrará. Só o tempo pode dizer, mas eu acho que essa é a minha maior paranoia; na verdade, um gatilho.