Eu amo o Brasil! E isso não é exatamente uma novidade, nem algo tão especial, pois quase todo mundo adora dizer que ama o Brasil, principalmente quando passa um tempo lá fora… A questão é: que Brasil você ama?
Meu trabalho me levou a conhecer profundamente este país. Já filmei em todos os estados, subi em favelas nas principais capitais e me encantei com florestas em todos os biomas. E poderia hoje dizer, com tudo que vi, que odeio o Brasil. É que, para amar o Brasil, temos que entendê-lo em sua profundidade e total contradição. Não é um amor fácil, por ser muitas vezes desconfortável, cruel e sujo. Nossa realidade é complexa e caótica; nossas cidades, precárias; nossa gente, sofrida. Não é um espelho cristalino, bom de se ver, mas todo craquelado, onde cada pedaço tem um eu refletido diferente do outro, cheio de distorções causadas pela violência de nossa sociedade.
Como se reconhecer numa pessoa que vive uma vida completamente diferente da sua? Com uma história que lhe deu valores totalmente diversos do seu? Mais uma vez, meu trabalho me indicou um caminho: para contar histórias, tenho que entender as motivações de todos os personagens, até do mais cruel dos vilões. Essa habilidade me faz ter empatia com quase todo mundo. Digo “quase”, pois meu trabalho também me ensinou que existem pessoas ruins, mas me provou também que a grande maioria dos brasileiros é muito legal, principalmente quando vencemos as barreiras do nosso preconceito.
Sou amigo de indígenas evangélicos, surfistas reacionários, analfabetos geniais, maconheiros responsáveis, malandros sensatos, policiais macumbeiros… E a lista não para por aí. A sobreposição de qualidades neste país deixa qualquer um louco, sem chão, menos aqueles que amam a vida como ela é. Difícil, mas esplendorosa!
É nesse sentido que minha vida e meu trabalho caminham, com muita curiosidade por tudo que há no mundo, e sem medo das dificuldades. Vamos nessa?
Estevão Ciavatta é cineasta e sócio-fundador da Pindorama Filmes. Entre as obras da produtora, destacam-se o programa “Um pé de quê?”; o documentário “Amazônia Sociedade Anônima”; a série “Vozes do Clima”; a experiência de realidade virtual “Amazônia Viva”, melhor filme do Festival Planeta, em Barcelona, em 2023; e a campanha “Jatobá — Árvore Refugiada”, vencedora do Leão de Ouro em Cannes, em 2022.