Foto: Beti Niemeyer
Há momentos de alegria. Há momentos de encantamento. Há momentos de risadas. Há momentos de epifania. Há momentos em que nos reencontramos com a nossa história. Há momentos das mais profundas emoções. Há momentos em que temos certeza de que só o teatro é capaz de nos colocar como coletividade, como brasileiros. Há momentos em que nos reencontramos com o nosso íntimo, com o nosso ser. Há momentos em que ver espetáculos como “Eu não me entrego, não!”, “a autobiografia” de Othon Bastos, com dramaturgia e direção de Flávio Marinho.
Como bem nos apontava Luciana Braga em Judy, ao mencionar Flávio Marinho como o produtor/diretor/autor, de forma esfuziante, Flávio Marinho aqui é muito mais do que esses três papéis, ou mais do que isso. Como um mágico, vai retirando palavras, diálogos, frases ao mesmo tempo em o Othon se movimenta, ocupa o palco com uma miríade de gestos amplos, voz com todas as sílabas perfeitas, ganhando a dimensão que a proposta merece.
Agora, de Othon Bastos há que se falar de sua idade, 91 anos, que vira apenas um ponto nesse oceano de talento. Tudo é gesto, é representação que enche o palco de personagens, de cenários, de figurinos, de lembranças, mesmo daquilo que não vimos. Othon é vigoroso, expressivo, contido, aberto, cômico, trágico, engraçado, triste, sozinho e acompanhado — tudo isso e mais o que é inimaginável que alguém possa fazer, com aquela aparente e mentirosa facilidade, como Othon realiza em todos os momentos.
Há ainda a genialíssima ideia de uma “memória” sentadinha a uma mesa, para fazer o ponto e o contraponto dos possíveis esquecimentos de Othon, assim como a contracena em algumas cenas. É o talento de Juliana Medella, diretora-assistente que é o melhor tertius possível na dupla Flávio Mario Marinho/ Othon Bastos ao fazer a memória. Há, assim, momentos em que só o teatro é capaz de nos provocar o nosso melhor. “Eu não me entrego, não!” é a melhor prova disso.
Serviço:
Teatro Vanucci, no Shopping da Gávea, sexta e domingo, às 20h, e sábado, às 20h30.