Projeto que equipara o aborto ao homicídio sob pena que pode chegar a 20 anos de prisão, com votação-relâmpago na Câmara dos Deputados, nessa quarta (12/06), e criminaliza até as três situações já permitidas (estupro, risco à vida da mulher e anencefalia fetal), virou assunto no Brasil, de fora a fora, fazendo até jornalista chorar no ar, como aconteceu com Monica Waldvogel, na Globonews. Procurado, o psicanalista Arnaldo Chuster comenta:
“Mais uma vez, questões complexas são tratadas de forma simplória, dando a falsa impressão de uma disputa pelo monopólio da verdade. O debate, notoriamente, tem sido vencido pelo simplismo dos setores conservadores. A entrada do Judiciário no assunto expõe de outra forma a ambiguidade do problema e revela questões cognitivas assustadoras. Não existe, na maioria da sociedade, nenhuma real vontade de punir o aborto — todos estamos conscientes de que ele é a ponta de um iceberg cuja base é a Educação mal fornecida pelo Estado investidor em privilégios de grupos. Por que então criminalizar o aborto? Não é igualmente criminoso, autoritário e cruel tentar impor um direito formal quando não existe convicção de crime? Afinal, quando se trata de foro íntimo, de um direito das mulheres, donas inequívocas de seus corpos, quem deve decidir?”
Ele completa: “A falta de certeza, a complexidade não levada em conta, o despreparo técnico em área da saúde e conhecimento antropológico fazem com que a decisão tomada por quem está dissociado da realidade somente irá criar um processo ineficaz de controle e jogar mais fervura no caldeirão do inferno que estamos vivendo neste país!”, ele completa.
Aqui, parte da fala do comentarista Octavio Guedes, que viralizou: “A bancada evangélica pode entrar para a história criando um projeto de lei que beneficia o estuprador. O estuprador está sendo incentivado a caçar mulheres em período fértil e ter um filho porque, se ela é condenada, ela vai ter a pena maior. E aí eu vou dar um passo a mais: ele pode até pedir a guarda dessa criança porque como é que vai deixar com uma homicida? Como é que vai deixar com uma mãe presa? Então, ele fica com essa criança, inclusive pra poder abusar dessa criança.”
Segundo o Anuário Brasileiro de Segurança Pública, a maioria das vítimas de violência sexual são crianças: anualmente, cerca de 20 mil meninas com menos de 14 anos se tornam mães. A pena máxima para um estuprador é de 10 anos, e a pena que o texto quer aplicar às vítimas que recorram ao aborto é de até 20 anos.
Quaisquer filhas de parlamentares, que eventualmente precisem fazer um aborto, podem pagar e, portanto, ficar tranquilas, pois não fazem parte das estatísticas.