Vejo com bons olhos os cuidados para termos uma linguagem politicamente correta, que não fira nenhuma suscetibilidade.
(Ops, “vejo com bons olhos” pode ser uma expressão ofensiva aos portadores de deficiência visual. Digamos que eu nutra simpatia pela causa.)
(Peralá, será que o verbo “nutrir” não pode ser um gatilho para quem sofre de anorexia, bulimia ou outros transtornos alimentares? Para quem passou – ou ainda passa – por algum tipo de privação nutricional? Para quem fez bariátrica? Ou prestou vestibular para Nutrição e foi reprovado?)
(Ok, digamos que eu simpatize. Ponto.)
(Hmmm, será que esse “digamos” não soará hostil a algum portador de deficiência da fala?)
(Ops, escrevi “soará hostil”… “Soar” pode ser excludente em relação a que tem deficiência auditiva. Deixa eu ver como vou fazer….)
(“Deixa eu ver”… olha eu de novo usando o verbo “ver”, que é….)
(Putz, “olha eu” também insinua que só os que enxergam direito possam me entender.)
(Gente, usei a palavra “direito” no sentido de algo perfeito, o que carrega, implicitamente, preconceito contra os canhotos. É preciso ter muito tato nessa hora.)
(Caramba! “Ter tato” exclui os disáficos! Tenho que agir com mais cautela.)
(Acho que ninguém mais tem cautela de penhor na Caixa Econômica, tem? A última coisa que eu quero é usar alguma palavra que magoe ou traga lembranças amargas….)
(Sei não, a palavra “amarga” pode afetar emocionalmente quem sofre alterações na percepção do paladar. Estou careca de saber que preciso apurar meu faro e tentar encontrar expressões bem neutras, daquele tipo que não fede nem cheira, sabe como?)
(Eita! Acabo de ser calvofóbico e de melindrar os portadores de anosmia e a hiposmia. Tenho que pesar mais o que digo e…)
(Desculpem: fui gordofóbico. O peso não pode servir para qualificar ou desqualificar nada. Vou ponderar, estar mais atento…)
(Perdão aos portadores de TDAH, e a todos que têm uma mente diferenciada em termos de concentração e percepção. Acho melhor abandonar este texto e…)
(Não, “abandonar” não, porque este verbo deve trazer muita dor a quem levou um ghosting, um pé na bunda, um perdido. Vou retomar o primeiro parágrafo e desta vez hei de conseguir evitar qualquer palavra ou expressão potencialmente tóxica.)
(“Potencialmente tóxica”? Cacilda, magoei numa tacada só os dependentes químicos e os portadores de disfunção erétil. Melhor picar a mula e…. não, especismo não, é covardia!)