“De vinte em vinte anos / Aparece no mundo uma nova geração / Mas de quarenta em quarenta / É que todas as coisas se repetem. / Por isso não tenha medo / Quando sua filha é tão maluca quanto a sua mãe / Quem sabe os seus netinhos não vão ser / Tão caretas quanto você.”
A lição é do filósofo Zé Rodrix (1947 -2009). Ele ecoa uma teoria conhecida dos hindus, que depois reapareceu entre os egípcios, os judeus, os gregos, os maias, os astecas e foi parar em Nietzsche, antes de desembocar na MPB.
“Em apertada síntese” (como dizem os ministros do STF antes de discorrer por 4 horas e 58 minutos), o “eterno retorno” é uma espécie de disco arranhado da História: estamos fadados a nos repetir infinitas vezes. Mais ou menos como quem elege Jair Bolsonaro para se livrar do PT, depois elege Lula para tirar Jair Bolsonaro, e aí elege Eduardo Bolsonaro para tirar o Lula, e em 2030 estará elegendo Gleisi Hoffmann para tirar Eduardo Bolsonaro. E em 2034 elegerá Carluxo Bolsonaro para tirar Gleisi Hoffmann, e em 2038 – se ainda houver Brasil – elegerá Marcia Tiburi para tirar Carluxo Bolsonaro.
Sim, o eterno retorno também atende pelo vulgo de “círculo vicioso”.
Acontece na História como na natureza. Os ciclos naturais são facilmente observáveis: o sol nasce e se põe, para nascer de novo no dia seguinte (ok, não é o sol que nasce no dia seguinte, mas o dia seguinte que nasce quando o sol se levanta, mas isso é irrelevante para a minha argumentação). As estações se sucedem: primavera, verão, outono, inverno, sempre nesta ordem (exceto no Rio de Janeiro, onde o verão pode dar as caras a qualquer momento, em edição extraordinária, como neste 24 de julho, que supostamente deveria ser um dia de inverno).
Mas isso também faz parte do eterno retorno: as coisas não são reprisadas de modo exatamente igual. Karl Marx (o mais sábio de todos os marxistas, porque preferiu não viver o suficiente para ver sua teoria colocada em prática) escreveu: “Hegel observa em uma de suas obras que todos os fatos e personagens de grande importância na história do mundo ocorrem, por assim dizer, duas vezes. E esqueceu-se de acrescentar: a primeira vez como tragédia; a segunda, como farsa”. Faltou dizer que continua se repetindo ad aeternum como embuste, engodo, fraude, falcatrua, arremedo, pastiche, paródia, simulacro.
Veja a boca das calças, em perpétuo movimento de sístole e diástole (escreve aí: você ainda vai usar pantalona de nesga outra vez). O cós que abaixa e sobe, do santropê ao santropeito. A gravata que estreita e alarga, em efeito sanfona. A sobrancelha que afina e engrossa, a calça de tergal que não desbota nem perde o vinco (e leva 400 anos para se decompor na natureza, além de ser altamente inflamável) e a de jeans que já vem destruída de fábrica. Tome nota: seus netos vão usar camisa Volta ao Mundo, calça Pervinc 70, cinto de calhambeque, anel brucutu, topete de Glostora, ter um Mug pendurado no retrovisor interno do Mustang e abastecer num posto Esso para ganhar um elefantinho. Sim, eu sei, o elefantinho era da Shell, mas se tivesse prestado atenção no parágrafo anterior, se lembraria de que alguma coisa sempre muda (e não necessariamente para melhor).
A música de sucesso no momento é “Tem cabaré esta noite”. Não é funk, não é sofrência, não é sertanejo universitário. É uma lambada.
A lambada voltou, junto os monitores coloridos, a varíola e aquela maquininha de remarcar preços no supermercado (pode tirar do fundo da gaveta o seu crachazinho de Fiscal do Sarney!).
Pena que você tenha descartado o blazer de ombreira, o sapato cavalo de aço, a camisa de anarruga e desativado a despensa onde estocava a compra do mês.
E não foi falta de aviso. Em 1974, no Globo de Ouro, o Zé Rodrix, já tinha cantado a pedra:
“De vinte em vinte anos / Aparece no mundo uma ideia nova / Mas de quarenta em quarenta
É que todas as ideias se repetem. / Por isso não tenha medo / Quando a sua filha fica do lado da sua mãe / Faça com que ela se case / Pra ter muitos netinhos iguais a você.”