Filhos? Nem pensar. Estabilidade financeira? Passou longe. Dormir oito horas por noite? Seria um sonho. Essa é a realidade de muitos jovens que enfrentam a crise dos 30 anos e todo o peso desse título. Passamos a temer o futuro, a duvidar se realmente temos todo o tempo do mundo e se estamos no caminho que nos leva às grandes conquistas da vida adulta.
Se você tem esses sentimentos, acredite, não está sozinho. Temos um pouco menos de inseguranças do que com 20 anos, mas ainda sem a maturidade que os 40 nos proporciona. Ficamos no meio de duas gerações, mas com uma carga de muitos processos decisórios. Ser mãe, congelar óvulos ou não, a maternidade é o maior peso para mulheres nessa faixa etária, além das mudanças na vida profissional. Os 30 vêm com pressão.
É comum uma crise em que existe a cobrança para ser bem-sucedida, ter uma vida profissional resolvida, casamento, filhos, além da questão estética, que ainda é muito presente. Apesar de as inseguranças sobre o corpo e a sexualidade serem menores do que aos 20, ainda se tem uma pressão intensa, que dificulta o processo de aceitação.
Você começa a pensar que não é mais tão jovem e que sua trajetória de vida não foi exatamente do jeito que imaginou. As pessoas percebem que se tornaram adultas e, apesar de ainda serem novas, não são tanto para fazer tudo de novo — desde características pessoais, até uma mudança profissional.
É um momento em que a vida profissional se confunde com a própria identidade da pessoa. Temos a sensação de estar velhos para grandes mudanças. Há, de fato, uma energia diferente da que você tinha há 10 anos. Existe toda a pressão de muito trabalho em busca desse sucesso profissional e financeiro, uma grande necessidade de autonomia, o que acaba sendo, muitas vezes, incoerente com os outros desejos e anseios desse período, que vão desde diversão intensa até a questão de ter filhos. É uma fase de pressão de todas as áreas da vida, literalmente, inclusive da saúde, que começa a dar indícios, caso se mantenha o modelo de alimentação e estilo de vida dos 20. A ressaca, o sobrepeso, o colesterol, a pressão arterial são diferentes.
A crise dos 30 pode se manifestar de forma repentina ou ir acontecendo aos poucos. Cansaço extremo, questionamentos sobre o modelo de vida atual, adoecimento físico ou emocional são algumas de suas principais características.
Um estudo realizado pela Bayer, Federação Brasileira de Ginecologia e TANCO (Think about Needs in Contraception), em 2020, aponta que 1.113 mulheres brasileiras, de 18 a 49 anos, não desejam ter filhos nos próximos cinco anos, o que equivale a 81% das entrevistadas; 56% estão em uma relação estável e 74% trabalham integral ou parcialmente. Essas mulheres que optaram por não ter filhos constituem a chamada ‘Geração NoMo’ — ‘Not Mothers’, em inglês.
Adiar o casamento e a chegada dos filhos é uma tendência nessa fase. Isso acontece, principalmente, pelo crescimento profissional, que costuma ser muito intenso nesse período. É a partir, daí que a crise chega de forma desigual para elas, por conta de toda a pressão em relação à maternidade. Os homens se sentem pressionados a ser bem- sucedidos financeira e profissionalmente, enquanto nós, mulheres, sofremos o mesmo, e ainda tem a questão biológica adicional.
O que nos prejudica é não enxergarmos o fim do túnel. Por isso, mesmo que esteja insatisfeito, é fundamental fazer um plano de curto, médio e longo prazos.
As saídas para essa fase são, principalmente, tirar o olhar da falta, ou seja, daquilo que a pessoa não tem naquele momento, enxergar o que está conseguindo e o real contato com o que ela deseja, assumindo as limitações que isso possa trazer. Não é uma visão positiva das coisas, mas sim ampla do todo.
O autoconhecimento se torna fundamental. Como é uma fase de transição e de muitas decisões, é como se a pessoa se sentisse, às vezes, frustrada, pois as aspirações dos 20 permanecem, enquanto existem limites que a idade ou a pressão social proporcionam. Logo, o autoconhecimento é essencial para que os desejos, expectativas e limitações possam se organizar entre si. Do ponto de vista clínico, muitas pessoas dessa idade apresentam transtornos relacionados à ansiedade e ao estresse, como burnout e transtornos de ansiedade.
Foto: Gabriel Morgato
Daniela Faertes é psicóloga, formada pela PUC-Rio, especialista em terapia cognitiva e mudança de comportamentos prejudiciais. Atuou no Serviço de Psiquiatria da Santa Casa de Misericórdia do Rio e, como supervisora, coordenou o núcleo de tabagismo; criou também o setor de amor patológico. Foi uma das primeiras a trazer para o Brasil os novos modelos e técnicas de Psicoterapia Cognitiva e é membro da American Cognitive Therapy Association. Faz atendimento nas áreas de mudança comportamental, bem-estar, transtornos psiquiátricos, dependência química e outras compulsões. Atualmente, é diretora do Espaço Ciclo.