A Mangueira entra na avenida às 23h desta sexta (22/04), com um enredo que mostra a biografia de três grandes baluartes: “Angenor, José & Laurindo”, o Cartola, Jamelão e Delegado, com os toques do carnavalesco Leandro Vieira. “Será um carnaval mais baseado na emoção, com um desfile mais clássico”, avisou Leandro, campeão com a escola em 2016 e 2019.
E para tornar essa emoção real, quem vem representando Jamelão (1913-2008) é o também cantor e compositor Jamelão Netto, 42, como diz o nome, neto de um dos homenageados, que o chamava Jamelinho quando ainda podia ser carregado no colo. Ele entra no último carro da escola, ao lado de Alcione. Netto faz parte dos compositores da Mangueira desde 2009, um ano depois da morte do avô. Desde então, é um dos puxadores, mas este ano vai ser diferente.
Qual a emoção em entrar na avenida nessa condição?
É muito difícil estar nesse lugar de representar meu querido avô Lão. Eu digo isso de uma maneira muito íntima e particular, que, desde muito antes da sua partida, quando lá atrás, eu ainda não entendia o meu papel dentro desta sociedade que nunca privilegiou artistas pretos como a gente, embora sejamos merecedores, pois sempre será, a partir de nós, toda a referência da música brasileira. Quando consegui enxergar sua importância, comecei a representá-lo como ele merece. Minha relação com a Mangueira vem de berço, deste as feijoadas do tio Jair, da minha paixão platônica pela Alcione, até chegar aos ensinamentos dos baluartes. S lou dessa estirpe e, justamente por isso, preciso regar e manter toda essa árvore em verde e rosa, mas a ficha só caiu quando fui convidado pela Velha Guarda da Mangueira a excursionar pelo Brasil como o único jovem a estar entre personalidades que conviveram com meu avô, Cartola, Delegado, Nelson Cavaquinho, Nelson Sargento e Dona Zica.
Qual a maior lembrança que você tem do seu avô e o que você aprendeu com ele?
Aprendi que, se não for pra entregar algo bem feito, não faça, e que o artista constrói sua trajetória com muito esforço e precisava estudar muito, pois tudo é sempre mais difícil pra nós, pretos. Ter uma referência patriarcal dentro de uma casa administrada por mulheres foi muito importante. Aprendi com o meu avô a respeitar os processos de cada um e falar pouco, observar bastante e, na hora H, entregar o meu melhor.
Você está preparando muita coisa para o centenário do seu avô…
Acho importante a gente construir coletivamente projetos que tenham como base um ícone preto do início do século passado. O Projeto “Mestre Jamelão 100” será desenvolvido pela iniciativa privada, mesmo com esse sucateamento da nossa cultura, e vai ter uma série de desdobramentos, onde o ponto de partida será o “Museu Virtual Mestre Jamelão” — ele era um acumulador e guardava desde notinha de jornal a capa de disco. Depois, uma biografia que já está sendo pensada com um escritor preto e eu como coautor, além do documentário “O Mestre”, que está em fase de captação. Hoje, só estou aqui porque sei o tamanho dessa representatividade e quero mostrar ao mundo todo esse legado.