Segundo a jornalista Cora Ronai, o indulto diz muito mais sobre Jair Bolsonaro do que sobre Daniel Silveira. Certíssima ela.
Como prerrogativa exclusiva do presidente, o ato deveria redobrar a preocupação de quem o concede.
Se na campanha, Bolsonaro prometeu que não daria indulto a ninguém, uma vez eleito sacou a Bic para perdoar Silveira que, como ponderado por Wálter Maierovitch, não merecia pena tão dura,’não era pra tanto’, o STF ‘pesou a mão’.
O pitbull de estimação do Palácio da Alvorada se deu bem, mas não é só por aqui que indultos são concedidos por motivos paroquiais.
Como uma premonição zodiacal, o primeiro indulto de Donald Trump beneficiou um dublê de devoto eleitoral e truculento policial. O xerife John Arpaio havia sido condenado por violar direitos civis de latinos e negros no Arizona. No decreto, Trump realçou os ‘admiráveis serviços prestados à nação’ pelo racista que uma vez comparado à Klu Klux Klan, declarou – ‘I think it’s an honor’. Uma dupla honra: ser comparado à Klan e indultado por Trump.
Apesar da bronca generalizada, judiciário e legislativo dos EUA não se intrometeram. Não lhes cabia tal papel.
Animado, Trump saiu de cela em cela, de ala em ala, liberando um pavilhão de compadres: seu assessor de segurança nacional Michael Flynn; Paul Manafort, ex-chefe de sua campanha; o consultor Roger Stone; Charles Kushner, sogro de sua filha Ivanka. Todos processados no caso da interferência russa nas eleições de 2016.
Perdoou o ex-governador Rod Blagojevich, que pôs à venda a vaga de senador de Barak Obama e foi sentenciado a 14 anos de prisão por corrupção; o ultraconservador Dinesh D’Souza por lavagem de financiamento eleitoral; o estrategista Steve Bannon, por desviar dinheiro de campanha.
Indultou também os mercenários da Blackwater Security Company que fuzilaram 17 civis (duas eram crianças) no massacre da praça Nisour, em Bagdá.
Traçado esse paralelo, ganha uma viagem à Pasárgada quem apostar que Allan dos Santos, Zé Trovão, Roberto Jefferson, a quadrilha das rachadinhas e todos os amigos do rei enrascados com a justiça serão os próximos contemplados.
Voará de executiva quem acertar que o vizinho Ronnie Lessa e os milicianos que trucidaram Marielle e Anderson serão contemplados.
Somente alterando a Constituição é que poderemos nos livrar desses riscos. Com ou sem Bolsonaro.
Os parlamentares que reúnem competência para cassar o mandato do deputado indultado, acabam de nomea-lo vice-presidente da Comissão de Segurança Pública da Câmara.
Parafraseando a Cora, isso diz mais sobre nossos congressistas do que sobre Daniel.
Helinho Saboya é advogado.