Vejo, tanto no meu trabalho quanto no meu círculo pessoal, uma dificuldade grande de as pessoas encontrarem seu caminho na vida profissional. A dificuldade é ainda maior para as novas gerações que, diante de infinitas opções, sentem-se perdidas e angustiadas. Há, além do mais, uma pressa para tomar um caminho certo para o sucesso, seja lá o que isso signifique para cada um.
Como tive uma descoberta e satisfação profissional tardia, falo aqui um pouco da minha profissão, na esperança de trazer alguma calma para quem ainda não achou sua trilha. Isso é possível!
Minha primeira formação, em Marketing, aconteceu junto com o meu casamento e com duas gestações. Isso significa que foi em ritmo lento, com alguns períodos de matrícula trancada para o nascimento das minhas filhas. Por muitos anos, dividi-me entre o marketing e o cuidado com elas. Trabalhei em áreas diferentes até abrir um escritório de Marketing Cultural, área que me interessava mais que os últimos trabalhos. Ainda assim, nunca me senti plena na minha profissão. Quando a cultura começou a perder espaço e também recursos, o escritório começou a ficar devagar. Ao mesmo tempo, minhas filhas decidiram fazer faculdade fora do Brasil. Com as responsabilidades de mãe amenizadas, tomei coragem para tentar me reinventar e partir para uma nova faculdade.
Desde os 18 anos, faço análise, que sempre foi parte fundamental na minha vida. O interesse pelo inconsciente sempre esteve presente, mas, como já tinha outra carreira, tinha receio de recomeçar do zero. Foi muito importante o apoio de minha mãe e irmã, ambas psicólogas, e do meu próprio analista, que incentivava esse interesse. Meu encontro com a psicologia, como estudante, foi na Puc-Rio. Foram cinco anos convivendo com pessoas da idade das minhas filhas — um desafio inspirador, que me trouxe amizades muito especiais.
A maturidade e os anos de análise ajudaram a me sentir, logo de cara, muito à vontade durante a graduação. Foram vários estágios com crianças, adolescentes e dependência química. Encantei-me profundamente com o trabalho realizado no AA (Alcoólicos Anônimos) e pensei em trabalhar nessa área. No entanto, aos poucos, fui me aproximando de um outro perfil.
Formei-me em 2018 e trouxe comigo os pacientes sociais que atendi no último ano de formação da PUC. Entrei no Instituto Cultural Freud, um centro de formação e atendimento psicológico e comecei a atender novos pacientes quando o mundo foi atropelado pela crise do coronavírus.
A pandemia, como todos sabem, trouxe um enorme desafio para nossa saúde mental. Deparamos com o desamparo absoluto que, suspeito, nem o genial Freud, nas piores previsões, poderia imaginar uma situação como esta que vivemos. A demanda por terapia cresceu muito, ok, e os atendimentos virtuais que aconteciam para pacientes morando no exterior, ou em ocasiões específicas, viraram uma realidade, sendo, muitas vezes, uma tábua de salvação.
Meus pacientes são, em sua maioria, jovens entre 21 e 28 anos, essa geração cheia de possibilidades e caminhos abertos, mas que, por pressa de se descobrir — além das muitas outras questões destes tempos modernos —, acaba alimentando seus medos e angústias. Atendê-los nos primeiros meses, quando estavam sem aula, sem interação social, e com quase nenhuma perspectiva do que seria de suas vidas foi, com certeza, um aprendizado para minha vida — talvez a minha própria tábua de salvação.
Com a pandemia, confirmamos, mais uma vez, que não sabemos nada de véspera. Acredito que, só através do vínculo e do acolhimento, é possível criar pontes para atravessarmos momentos difíceis e de tanta incerteza para encontrarmos nossos rumos. Afinal, é o amor que dá possíveis contornos aos nossos vazios.
Filha de diplomata, Gilda Amado nasceu em Washington (EUA), mas não poderia ser mais carioca. Com a primeira formação em Marketing, decidiu cursar Psicologia e formou-se em 2018 pela Puc-Rio. É membro do Instituto Cultural Freud, na Lagoa, um centro de formação e atendimento psicológico que visa o intercâmbio da Psicanálise com a Cultura através de palestras e cursos.