Trabalhei por dez anos, fotografando a Amazônia. Em 2014, convidado por fazendeiros preocupados com o Pantanal, embarquei em trabalho de documentação fotográfica da região. O que aprendi? Que o Pantanal é muito mais frágil do que a Amazônia.
Destruir a Amazônia levará muitos anos e deixará marcas e evidências: árvores derrubadas, indígenas abatidos etc.
A poesia do Pantanal, sua riqueza biológica imensa, apoia-se em um tênue equilíbrio entre água e terra, secas e inundações. O poeta Drummond de Andrade comparou o Pantanal ao amanhecer do primeiro dia da criação. Não é mais.
A maior planície inundável do Planeta, com extensão de um país como a Grécia ou a Síria, na verdade, considerada apenas exótica pelos brasileiros, tem, de fato, imenso valor em serviços ambientais e um vasto “banco de espécies”, reunindo 1.082 espécies vegetais e 1.226 animais, muitos deles tendo ali seu único habitat, está seriamente ameaçada.
Ao longo das 10 expedições que fiz para meu ensaio sobre a região, percorri todas as sub-regiões, fotografando paisagens deslumbrantes e pantaneiros isolados. Mas vi também o Pantanal arder e o Rio Taquari secar – um rio caudaloso que foi navegado pelos bandeirantes que “abriram” o Brasil Central.
É fácil encontrar culpados, mas a verdade é que o Pantanal é vítima do Antropoceno: o Planeta paga a conta pelo desenvolvimento desequilibrado da espécie humana. A mudança climática, a alteração do regime de chuvas e o calor crescente atingem em cheio a região. E além de uma vigilância de brigadas antifogo e ações pontuais de preservação e reconstituição das cabeceiras como começam a surgir no rio Taquari, será necessário que o Planeta todo volte a pensar de forma holística e procure frear aquilo que hoje parece irreversível.
Eu poderia encher meu último livro, “Pantanal”, apenas com imagens de destruição e desesperança. Não foi a nossa escolha. Decidimos mostrar também uma região magnífica, com paisagens praticamente desconhecidas e toda a sua riqueza e potencial. Ajudamos a criar o Documenta Pantanal, que apoia e divulga conhecimento e iniciativas de alerta e reconstrução.
Ao lado de incêndios e inundações permanentes, mostro o esplendor do que estamos destruindo antes de realmente conhecer: a florada dos ipês rosas-roxos é um dos maiores espetáculos naturais que os olhos humanos podem vislumbrar, a floresta nativa de Buritis, as lagoas do rio Paraguai e as serras do Amolar e do Maracaju (fronteiras leste e oeste da região) estão entre os espetáculos inescapáveis e praticamente desconhecidos dos brasileiros.
Como fotógrafo, muitas vezes fui testemunho da história humana. Hoje somos todos testemunhas e vítimas de transformações geológicas aceleradas.
O que ocorre no Pantanal é um grito de socorro do Planeta. Ainda é possível agir e fazer diferença.
João Farkas é fotógrafo e diretor de documentários. Suas fotografias já foram expostas em mais de 40 exposições no Brasil e no exterior, e obras estão em grandes museus e coleções privadas pelo mundo, inclusive a Maison Europeene de la Photographie, International Center of Photography, Tulane University, MASP-SP, MAM, MAR- Rio, MAM-BA, Instituto Figueiredo Ferraz. Publicou, entre outros, os livros: Amazônia Ocupada, Ed. SESC-SP, Trancoso, Ed. Cobogó, Caretas de Maragojipe, IOK e o recente Pantanal pelas Edições SESC-SP.
Na galeria, algumas fotos do livro “Pantanal”.