E lá fui eu, pelo projeto “OlhoVerde”, sobrevoar a bela baía de Ilha Grande, já me preparando para o que eu temia constatar. A quase certeza absoluta era fruto do que eu já via acontecendo junto das margens da Rodovia Rio-Santos.
Essa rodovia, inaugurada nos anos do milagre econômico dos anos 70, mais tarde, se tornaria o pesadelo da recessão, superinflação e estagnação dos anos 80. Por si só, ela já havia causado e viabilizado os maiores impactos ambientais na região, junto dos grandes investimentos públicos e privados que, em resumo, aumentaram vertiginosamente a população, principalmente do município de Angra dos Reis, sem, no entanto, gerar a infraestrutura básica necessária. Nada fora do comum no mundo verde e amarelo.
O resultado era previsível: crescimento urbano desordenado em morros e baixadas, falta de saneamento, privatização de praticamente todo o litoral por empreendimentos imobiliários que também contribuíram decisivamente para a degradação ambiental da região, nunca jamais vista até então.
Contudo, isso foi no século passado, e o passado nos ensina a não repetir os mesmos erros. Será mesmo?
No caso do Brasil, talvez por causa de motivos culturais, antropológicos, espirituais, genéticos, kármicos, ou mesmo em função das anomalias do campo magnético da Terra, as coisas são diferentes.
Na prática, num lugar onde tudo é teoricamente protegido legalmente, o que predomina é o caos. Pois bem, beirando a rodovia, lá do alto, a noção do tamanho do problema e do alastramento do crescimento desordenado é mais do que evidente e alarmante.
O que era uma quase exclusividade do núcleo populacional principal, isto é, a cidade de Angra dos Reis e de seus morros, o desmanche ambiental vai se multiplicando em inúmeros núcleos que avançam da rodovia como eixo principal do vetor de crescimento para dentro das áreas do outrora “sertão”, situadas a montante da rodovia ou a jusante, sobre as baixadas, suprimindo, aterrando, desmatando o que tiver pela frente.
Conceição de Jacareí (Mangaratiba), bem como Lambicada, Camorim, Camorim Pequeno, Sapinhatuba1-2-3, Japuíba, Banqueta (Nova Angra), Campo Belo, Gamboa, Belém, Itinga, Santa Rita do Bracuí, Bracuí, Frade, Perequê, todos em Angra dos Reis e sem exceção, repetem o crescimento a qualquer preço, em que a preocupação ambiental passa bem longe, e a legislação ambiental é apenas uma miragem. O resultado não poderia ser outro daquele que eu já esperava desde um dia antes do voo.
Rios apodrecendo, supressão de vegetação, fundo de baías como da Ribeira, transformando-se em latrinas, degradação de manguezais com as esperadas e já conhecidas consequências em termos de perda de biodiversidade e qualidade de vida.
Levaram-se em conta as peculiaridades geográficas que caracterizam e distinguem as baías de Guanabara, Sepetiba e Ilha Grande. Esta última não apresenta, nem em quantidade, nem em dimensões, as grandes planícies encontradas nas duas primeiras; mesmo assim, verificam-se os processos de degradação observados seguindo o mesmíssimo roteiro já conhecido.
Afinal, a cultura predatória é a mesma, portanto, o resultado final da ação continua também o mesmo.
Aí, lembrei que o atual Presidente da República, no ano passado, veio com a ideia da “Cancún verde e amarela” na baía de Ilha Grande!
À época, aproveitei o gancho e alertei às autoridades de plantão, ávidas pelo desenvolvimento, que sem investimentos pesados e permanentes em chagas socioambientais históricas, ou seja, habitação e saneamento universalizados, a tal “Cancún verde e amarela” poderia gerar o tiro final no principal ativo, transformando a região numa “Cocón marrom”, onde, mais uma vez, seria assada a galinha dos ovos de ouro por conta da cultura do pau-brasil: usar até acabar.
Meu alerta, como de praxe, não teve ressonância alguma em nossa classe política, mais preocupada com temas mais relevantes do que o ambiente.
Voltei ao heliponto cinco horas depois, com a certeza de que o recuo não é uma opção. Já “perdemos” a Guanabara, estamos perdendo a de Sepetiba e vamos abrir mão também de Ilha Grande?
Não aprendemos nada com a degradação e tragédias na Região Metropolitana?
Não aprendemos nada com a crise da água?
Afinal, o que é que está acontecendo nesse lugar com essas pessoas?
Fica a questão se as forças, segmentos econômicos e sociais esclarecidos, que tenho de acreditar que existam, irão aceitar candidamente a instalação irreversível da degradação na região da baía de Ilha Grande?
Estamos atrasados, e a hora da reação já passou!
Observação importante: Leiam o texto e vejam as fotos, ouvindo “The Ultimate Soundtrack Mix: The Matrix Series“.