Com centenas de lives piscando para todos assistirem sem pagar um real nas redes sociais, como ficam os artistas, digamos, menos conhecidos, sem trabalhar, com a pandemia? Muitas ONGs e associações têm feito campanhas de arrecadação e financiamentos coletivos, mas a empresária carioca Juliana Brittes, fundadora do aplicativo Sound Club, que existe desde 2016, criou uma outra plataforma para os artistas cobrarem ingresso pelas apresentações online. Assim nasceu o Sound Club Live. Em menos de quatro meses, o app está com seis mil músicos e 300 DJs cadastrados, põe no ar quase 2 mil shows diários e, dependendo da audiência, cada artista pode ganhar de R$ 150 a R$ 800 por uma hora de apresentações. “As grandes empresas estão pagando cachês milionários para artistas conhecidos, como Ivete Sangalo, Roberto Carlos, Jota Quest , Seu Jorge etc., mas não são só eles que movimentam um time de profissionais, como produtores musicais, empresários, técnicos de áudio e luz, roadies, músicos contratados (banda), fotógrafos, maquiadores e afins. Os pequenos e médios shows têm a mesma seriedade, e todos querem mostrar seu trabalho de forma que surpreenda a plateia”, diz Ju Brittes, que é formada em Odontologia pela UFF, mas segue outros caminhos. Como foi a ideia da criação do Sound Club? Apesar de ser dentista, ainda nova, fui trabalhar na madeireira do meu pai e, desde então, comecei a explorar caminhos distintos: abri uma empresa bem-sucedida de importação de ferragens em 2008, aos 27 anos, mas vendi oito anos depois, quando o mundo das startups surgiu na minha vida. Até então, não tinha intimidade com a tecnologia — eu nem tinha redes sociais —, mas sabia que meu caminho era o da cultura. Depois de um ano de desenvolvimento do projeto, lancei o Sound Club que, além de ser um mapa da música, onde cada usuário conseguia saber exatamente as bandas que estavam tocando perto da sua localização (uma espécie de Tinder da música), funcionava também como um link entre artistas e contratantes. E como surgiu a ideia de ajudar os artistas com uma nova plataforma? A velha máxima ‘na crise sempre há oportunidade’ veio logo à minha cabeça. Foi aí que pensei em criar um app que ajudasse, de alguma forma, os artistas que não têm onde fazer suas apresentações na nova era de shows virtuais. Foi tudo muito veloz e, em menos de um mês, a ideia já tinha se concretizado e o streaming feito para IOS, Android e Internet. Na primeira semana, tínhamos mais de 600 artistas cadastrados que já conseguiam monetizar suas lives e ganhar dinheiro em shows transmitidos de suas próprias casas. Para eles, além do dinheiro, claro, o maior prazer era continuar levando sua arte para o público e interagir. Como o app funciona? Qualquer artista do País pode entrar agora, fazer a sua apresentação, ensaio ou conteúdo online e monetizar, como se fosse um show presencial, tendo controle do seu público pagante. É um projeto inovador, até então inédito no Brasil. É a única plataforma de música em que o público paga diretamente para o artista independentemente de algoritmos, números de usuários ou seguidores. Os fãs ainda podem conversar através de bate-papo e interagir com o artista direto, na apresentação online. E o pagamento é superseguro, feito diretamente pelo botão ‘prestigiar’, através do cartão de crédito. E a aceitação? Hoje temos milhares de downloads em menos de quatro meses. A plataforma é um sucesso, e a procura foi surpreendente, até por artistas conhecidos, como Tico Santa Cruz, Rodrigo Suricato, Geraldo Azevedo, Rodrigo Santos (ex-baixista Barão Vermelho), Léo Fresato, Mz (1Kilo), entre outros. Teve alguma surpresa? Temos praticamente todos os estilos musicais, porém o que mais me surpreendeu foi o número de DJs inscritos, talvez os mais prejudicados na pandemia. Eles vão tocar onde? Só os grandes nomes, como Alok, fazem live de sucesso e, mesmo assim, no YouTube. Hoje temos mais de 150 que se apresentam, cobrando ingressos a R$10. E, mesmo no pós-quarentena, serão inúmeras as restrições. Por isso, a plataforma virou um palco para eles. O que espera do seu trabalho daqui pra frente? Tenho como missão profissional e sentimental com a cultura, ajudar esses profissionais que vivem da música e democratizar esse mercado de forma que todas consigam ganhar dinheiro mesmo fazendo seus shows de forma virtual. A cultura não pode parar. Tento mostrar todos os dias para os meus filhos (de 10 e 8 anos) que nós podemos ser o que quisermos, em qualquer momento de nossas vidas. Por isso, é importante o autoconhecimento, empatia, resiliência, persistência, não paralisar no medo, que baixa a imunidade. Para mim, esses são os pontos mais importantes para enfrentarmos os novos tempos que nos desafiam a cada instante.