Independentemente de pandemia, o nosso sistema tributário está defasado, e a reforma tributária é a mais difícil de todas. Ela exige um pacto nacional entre empresas, empregados, contribuintes, fisco e envolve municípios, estados, a União e todos os brasileiros, pois você já paga imposto quando nasce e quando morre, paga imposto dormindo e acordado, paga imposto trabalhando e paga desempregado, paga imposto como pessoa física e jurídica.
Neste momento de excepcionalidade, acompanhamos o desenrolar de uma grave crise, que nossa geração nem a geração anterior jamais viram. É fundamental que todas as medidas adotadas sejam feitas com planejamento e urgência. Diminuir a possibilidade de desempregos é essencial, é atitude humanitária, e aumentar tributos ou implantar novos impostos devem ser descartados por ora.
Urge pensar em tributação em tempos de pandemia, pensar na prorrogação de prazos de pagamentos e parcelamentos já existentes, bem como de obrigações acessórias, dar fôlego às empresas, ao setor produtivo para que os danos sejam menos perversos, sobretudo para a grande massa dos trabalhadores. As medidas anunciadas pelo Governo Federal nesse sentido foram tímidas – é necessário que elas sejam ampliadas e tenham força para possibilitar maior fluxo de caixa para as empresas, caso contrário, assistiremos a uma onda de empresas quebrando por inanição.
O que falta é coordenação e uma articulação maior em termos de Federação. Temos impostos estaduais e municipais que pesam muito, todavia, não é possível exigir que estados abram mão do ICMS sem uma contrapartida da União.
Em que pese ter havido a prorrogação de pagamento de alguns tributos para até 90 dias, a crise que se desenha poderá obrigar que haja maior flexibilidade ainda da parte do Poder Público. Até agora, não houve mudança em relação ao Imposto de Renda da Pessoa Jurídica, a não ser para as empresas que estão no regime do Simples. É importante olhar para quem está no regime de lucro presumido, uma vez que, nesse caso, o Imposto de Renda acaba recaindo sobre a receita. Não se está aqui a sugerir que as empresas deixem de pagar o Imposto de Renda até porque, se alguém tem lucro, mesmo na crise, deve pagar, mas esse lucro não pode ser fictício. Portanto, é preciso aprimorar os mecanismos para apuração do lucro real, com a possibilidade de compensação de prejuízos.
É necessário evitar o colapso do sistema de saúde e salvar vidas, contudo é preciso que o setor produtivo esteja inserido nesse plano. O Brasil tem uma indústria têxtil robusta, que poderia voltar sua capacidade à fabricação de máscaras de proteção, assim como nossa sofisticada indústria automobilística poderia fabricar os respiradores.
Estamos num esforço de guerra, literalmente. Precisamos de um grande pacto nacional, no entanto, o que temos visto é muito ruído entre as esferas de poder, uma perda de energia. Não cabe, neste momento, nenhuma política econômica de cunho liberal; afinal, nós nunca precisamos tanto da presença do Estado.
Não temos vacina até o momento. E qual é o roteiro? Durante o ano de 2021, vamo-nos refazer de pandemia, quarentena, e a economia dará os primeiros passos. Em 2022, temos eleição para Presidente. Teremos, pelo menos, dois anos de dificuldades, e vai coincidir com um novo governo, e é ele que vai ter legitimidade para aprovar a reforma tributária do século XXI. E, se Deus quiser, em 2023, estaremos livres dos vírus que o Brasil sofre hoje; o segundo não vou denominar.
Eduardo Maneira, é advogado, professor de Direito Tributário da UFRJ, doutor e mestre em Direito Tributário e presidente da Comissão Especial de Direito Tributário da OAB Nacional.