“Eu acredito no turismo do nosso Rio”. Foi assim que Otavio Leite, até então Secretário estadual de Turismo, anunciou a saída do cargo, no fim de junho, por “iniciativa própria”. Com quase 30 anos de vida pública (já foi deputado federal, vice-prefeito (de Cesar Maia), deputado estadual e vereador), teve dedicação intensa à pasta desde o começo do governo Wilson Witzel. Otavio conhece bem os problemas cariocas, chegou à cidade aos 3 anos, quando o pai, o ex-deputado estadual Fernando Prado Leite, enviou-o de Aracaju (SE), para se tratar de uma esquistossomose. Nunca mais voltou. Foi criado pelo avô, o então senador Júlio Leite, em Copacabana.
É advogado e professor universitário, pós-graduado em Políticas Governamentais pela UFRJ. Começou a vida política aos 29 anos. Em 1992, entrou na vida parlamentar, como vereador, três vezes consecutivas, até 2002. É autor de mais de 120 leis em vigor no estado e no município. Sua saída da secretaria surpreendeu muito, considerada uma perda para o setor, um dos mais essenciais em todos os momentos e, neste, ainda mais.
Em conversas ao pé do ouvido, muitos dizem que sua saída da secretaria de Turismo teria a ver com a suspeita de corrupção no governo.
Saí por razão eminentemente particular: um projeto acadêmico. Confesso que, de há muito, tenho essa dívida para comigo mesmo: fazer um doutoramento. Abriu-se uma última janela de oportunidade. Conversei com o governador, que compreendeu e apoiou. Aliás, recebi dele, desde o início da gestão, respaldo para trabalhar com autonomia e implantar um conjunto de ações eficazes para o reposicionamento do Rio nos mercados turísticos, dentro e fora do Brasil. Ele participou de diversas discussões nacionais e internacionais sobre Turismo, muito mais do que todos os governadores anteriores. Sempre foi muito correto comigo.
A sua saída surpreendeu muita gente no setor, principalmente os guias. Desde então, tem recebido críticas. Como lida com elas?
Veja, eu tenho um reconhecido histórico de atuação na causa do Turismo. Sou, inclusive, autor de importantes iniciativas em prol dos guias. Recentemente, consegui regulamentar um antigo pleito de lhes ser permitido o uso oficial do seu próprio veículo como instrumento de trabalho, a “Lei do Guia-Motorista”, por coincidência, de minha autoria como deputado federal. Fiz questão de ter os guias, ativamente, participando da elaboração do Selo Rio de Janeiro Turismo Consciente. Quanto às críticas, trata-se de um direito democrático.
Quais suas previsões para o Turismo do Rio na pós-pandemia e quais as medidas a serem tomadas logo de cara?
Ao longo desses meses, temos estudado o problema, olhando para todos os lados, identificando caminhos cogitados nacional e internacionalmente e, sobretudo, conversando com os profissionais e empreendedores do turismo do Rio através de dezenas de lives. A partir desses encontros, tiramos conclusões e desenvolvemos uma estratégia. A retomada será gradual, sobre rodas, e inspirada pelo reencontro com a natureza, num primeiro momento. As pessoas, tão logo as portas se abram, tomarão a estrada ao lado dos seus, rumo ao verde, ao rural, às areias, ao mar ou para as águas das cachoeiras… e o nosso Rio tem tudo isso… abundantemente! Assim, fixamos o raio de 400 a 500 km como mercado a ser trabalhado para atrair visitantes de SP, MG e ES, somando-se ao próprio turismo circular interno do Rio para o próprio Rio. O interior, com suas possibilidades e atrações, terá uma grande procura. Mas havia uma premissa a ser construída: carimbar todos esses nossos destinos e produtos turísticos com um Selo de Credibilidade. Daí criamos o “Selo Rio de Janeiro de Turismo Consciente” que, basicamente, oferece ao turista a condição de identificar, em cada município, quais os equipamentos, estabelecimentos e serviços turísticos que possuem esse selo, bem como cumprem rigorosamente as regras e mandamentos de saúde pública e prevenção à Covid -19. A adesão tem sido um sucesso. Hoje, mais de 2.300 já se cadastraram, sem nenhuma campanha publicitária, o que acontecerá em breve. Lançamos o Selo no mesmo dia em que a Espanha lançou o dela. Logo, haverá uma evolução gradual e constante, e chegaremos ao verão com muitos avanços.
O que mais funciona no Rio e o que não funciona de jeito nenhum?
O que mais funciona é a formidável capacidade de resiliência: inigualável. Tenho convicção, pela minha experiência e conexões nacionais, que o nosso Rio prossegue sendo “objeto do desejo dos brasileiros”. Do ponto de vista turístico, falo de um mercado gigante, sempre potencial, e esse é um ativo vivo, uma verdadeira máquina que faz funcionar o imaginário das pessoas. Nessa mesma perspectiva, diria também o privilégio de ser a face mais explícita do Brasil no exterior. Por outro lado, o respeito à Lei do Silêncio, em todos os estamentos da sociedade e, em praticamente, todos os bairros e comunidades, é uma mazela comportamental a ser enfrentada, uma vez que não funciona de jeito nenhum, apesar de alguns esforços sazonais.
O senhor disse que está partindo para um projeto acadêmico, aplicado ao doutorado em Turismo. O que vem a ser?
Meu objetivo é qualificar-me para melhor servir ao Rio e ao Brasil. Afinal, por mais que a tecnologia nos permita visualizar qualquer atração ou destino turístico através das telas e telefones, nada substitui viver o ambiente aberto, experiências reais, que confortam, que oxigenam, com paisagens e pessoas de que gostamos. E, se possível em companhia de uma cerveja, caipirinha ou vinho. O Turismo é muito mais do que isso!