Não precisa orquestra pra animar a festa… “Como é bom São João na roça”, já dizia Luiz Gonzaga. Pactuo. Sou desses. Como compositor de escola de samba, me associo ao carnaval, mas é, na festa junina, que me acabo. Gosto de comer, “sou magro de ruim” — agora, quem dizia era minha mãe. Milho verde, bolo de milho, canjica, pamonha, paçoca, quentão, salsichão, caldo verde… gosto das quadrilhas e do clima de junho.
Este ano foi diferente. Essa coisa toda, essa pandemia… nos obrigou a ficar em casa, e é bom que assim seja mesmo, até que tudo tenha uma solução. E, estando em casa, a mente arranja o que pensar e me remete aos meus afetos; um deles, a festa junina. Quem diria que iriam me fazer tanta falta um trio pé de serra e uma sensação infantil de estar entre amigos. O céu é tão lindo e a noite é tão boa. Nesses tempos de interiorização, é necessário o abraço amigo de uma lembrança confortável. Um alento, uma esperança.
“Vem ver quanta fogueira
No terreiro embandeirado
Foguetes e balões
Sob o céu todo estrelado
Namoro à moda antiga
Com suspiros ao luar
Vem ver coisa bonita
São João no arraiá” — cito Zé Dantas.
Sou do tempo das festas juninas de fogueiras caseiras, de comunidades inteiras, de amigos atemporais, de pular fogo e ouvir o grito “vai fazer xixi na cama”. De um tempo em que talvez fôssemos mais ingênuos… mais possíveis.
“Foi numa noite igual a esta
Que tu me deste o coração
O céu estava assim em festa
Pois era noite de São João”
Sou do tempo da paquera e velho por certidão e raciocínio, das noites tão brasileiras, das fogueiras, sob o luar do mundo inteiro. Brasileiro de festas, folguedos e tradições populares. Me faço festa junina então, em casa, reelembrando os afetos, os cheiros, os gostos e as noites de junho. E me empanturro de canjica, milho verde, bolinho caipira e saudades e xotes coladinhos ao som de trios nordestinos imaginários, criados espontaneamente pelo quentão real e egoísta da alma solitária de pandemia e fanatismo.
Dias melhores estão chegando, preparem seus corações. Estaremos juntos e fortes, resistentes e atentos — uma alvorada de festejos e superações, de justiça e de certezas. E virão novas danças e novas gastronomias, novos afetos, novos abraços. Hoje, em casa, a mente arranjou o que pensar e me remeteu às minhas lembranças mais gostosas. Só te digo uma coisa: ai que saudades que eu sinto das noites de São João!
Daniel Gonzaga é produtor musical, compositor, cantor, ator, roteirista, diretor de TV. Muita gente acrescenta: poeta. Teve o Gonzagão e o Gonzaguinha, o avô e o pai, como eles, ama o São João. (Foto: divulgação)