O município do Rio de Janeiro está fadado ao colapso! Destaco, porém, que esse não será o fim do Rio. Antes fosse! O fim é apenas para sociedades que perderam algo que tinham e pelo qual prezavam e, por algum motivo, além de sua vontade, por motivos muito além de sua força, simplesmente extinguiram as possibilidades de sobrevivência — coisa normal desde o início da história da vida neste planeta.
Aqui, não será diferente; será bem pior do que apenas o fim, visto que, depois dele, só resta um novo nascimento, com horizontes mais largos e inúmeras possibilidades. Aqui continuaremos perpetuando, solidificando tudo que tem dado errado, como num estado de limbo, lugar onde os mortos não conseguem desapegar-se de vez das três dimensões e evoluir.
As chagas históricas continuarão diante de administradores lenientes e de uma sociedade que, em boa parcela por necessidade, e principalmente comodismo, não quer, de jeito algum, sair de sua zona de conforto, seja ela qual e de que tamanho for. Ontem assisti a mais uma reportagem sobre o crescimento urbano desordenado na localidade denominada Muzema.
Se, por um lado, o poder público burocraticamente age na tentativa de paralisar obras completamente ilegais e algumas vezes até demolindo alguns imóveis, por outro, o crime organizado, como o nome diz, age de forma organizada e tecnicamente quase que impecável, a não ser quando as forças da natureza expõem a fragilidade das construções, continua avançando em seu empreendedorismo sem limites.
Não tenho como culpar a ação corajosa dos fiscais municipais, visto o poder de fogo dos empresários do crime. Afinal, quem dá cobertura para a atuação desses técnicos numa terra onde a lei funciona conforme pressão e temperatura, mudando de acordo com o tempo? A sociedade iria mobilizar-se em defesa da ação desses fiscais, mostrando que, por trás deles, há milhões de cidadãos prontos para se mobilizarem em caso de ameaças? Duvido!
Portanto, a bacanal continua apesar da sistemática cobertura dos meios de imprensa, e fica o dito pelo não dito, cada um em seu cercadinho, não incomodando os demais. É óbvio que todo o esgoto a ser gerado pelo crescimento desordenado vai parar em redes de águas pluviais e, destas, para a lagoa da Tijuca, como tem acontecido há décadas. Aliás, se outros delinquentes privados e públicos “vip” podem degradar com esgoto, por que os novos empreendedores da Muzema não poderiam? Ora, a lei é igual para todos! Claro que mais igual para alguns do que para outros, mas isso é mero detalhe jurídico.
Enquanto jorram fezes por todo canto, como acontecia antes dos Jogos Pan-americanos, Copa do Mundo, Cidade das Artes, Jogos Olímpicos —, e que continuará acontecendo após a atual pandemia —, a crise da água do ponto de captação do Guandu, abordado mediunicamente nesta coluna, no texto anterior, ganhou mais um grotesco capítulo nessa semana.
Mais uma vez, contrariando, como de praxe acontece com a estatal, as obras que seriam licitadas para iniciar no próximo mês de junho, na fala do atual presidente em fevereiro passado, foram para o “saco”, ficando agora sob a responsabilidade do INEA.
Sinceramente, não me surpreendi, até porque conheço o “modus operandi” dessa turma desde 1989; portanto ficaria surpreso ou à beira de uma convulsão se eles honrassem o que tinham se comprometido durante a crise da água. Um grande circo de horrores onde ninguém é nunca culpado de coisa alguma. Típico!
Mais uma vez, perdi meu tempo, em fevereiro passado, indo ao auditório da estatal, para falar o que eu achava de toda aquela situação, bem como ouvir mais uma promessa que acabou não se concretizando, como sempre. Nada de novo!
Pior mesmo foi a reação da sociedade, daqueles 6 milhões que bebem água proveniente daquela pasta de fezes tratada. Nem no meu texto anterior mediúnico tampouco na matéria da Globo, praticamente ocorreu qualquer reação. A turma que paga pelo produto acostumou-se com a ideia de beber água tratada originada de fonte contaminada por esgoto, e sabe-se lá mais o que, desde que não haja cheiro nem gosto.
Pois então, voltamos ao início deste texto, meio que em mais uma previsão mediúnica ambiental do que está acontecendo e continuará ocorrendo nesse lugar acostumado a extinguir, usar seus recursos até sua exaustão e a viver em condições de insalubridade crescente como se fosse a coisa mais normal que há.
A resiliência patológica, aquela doença amplamente distribuída, uma verdadeira marca no genoma do carioca de aceitar o inaceitável, incorporando os maiores absurdos à paisagem e ao cotidiano de nossas vidas, criará um purgatório permanente, muito pior do que já normalmente encontramos nesta cidade, acostumada a fazer graça com suas chagas.
Vamos continuar degradando, contaminando, desmatando e principalmente elegendo o que há de mais fácil, o que há de mais rasteiro, o que mais nos agrada ouvir, o que há de mais convidativo para que nossas responsabilidades individuais e coletivas não assumam o purgatório ou talvez o próprio inferno que temos criado para as futuras gerações.
Deus salve a criação, pois estamos perdidos na escuridão que criamos e cultuamos!