Escutava falar de meditação, o assunto sempre me interessou, eu lia um pouco, tentava praticar um pouco, conversava um pouco sobre as possibilidades, vislumbrava, mas não desenvolvia. A certa altura, me recomendaram a Meditação Transcendental, MT, e eu fui. Fiz toda a primeira semana, continuei mais um pouco e, na sequência, as minhas primeiras dúvidas triplicaram. Eu estava fazendo certo? Aquilo era meditar? Aquele era o caminho? Acho que quem primeiro falou a sério sobre meditação comigo foi a minha bicicleta. Pedalava por lazer, aos fins de semana, e vinha tentando aprender a andar sem segurar no guidão. Gosto de aprender coisas, sempre procuro algo novo pra começar. E eu devia estar no meu 14º dia de meditação quando, no domingo, peguei a bicicleta, soltei o guidão e fui. Nem acreditei; de repente, do nada, eu sabia andar com as mãos soltas.
De alguma maneira, meu corpo aprendeu a se posicionar para eu não perder o equilíbrio. Fiquei muito impressionada com aquela experiência, mas, só depois de alguns dias, conversando com a minha professora de meditação, eu entendi. Eu tinha ido me lamentar com ela, dizia que os pensamentos não me deixavam na hora da meditação, que eu achava que estava fazendo algo errado. E ela, depois de pacientemente me escutar, sugeriu que eu reparasse no que estava acontecendo na minha vida fora dos dois horários diários de meditação. Quando ela falou isso, minha ficha caiu! A bicicleta. Pronto! Percebi que estava no caminho que eu queria.
Meditei assiduamente – ainda tinha aquelas mesmas dúvidas, mas já não me preocupava tanto com elas. Eu queria evoluir, eu queria “meditar de verdade”, mas aceitei o caminho, topei ir praticando e ir progredindo mesmo que milimetricamente. Meditação estilo baby steps! Minha vida do lado de fora, no entanto, tinha mudanças mais perceptíveis. No aspecto profissional, eu melhorei muito, melhora tipo mágica porque eu não sabia explicar; de repente, as coisas iam se encaixando e dando certo. Trabalho para uma empresa internacional no Rio e, no auge da crise da violência em 2018, tive um expressivo bom ano, foi realmente algo meio mágico. Mas, de fato, aconteceu comigo. Quando chegou o carnaval, mil blocos tomavam os bairros da Zona Sul do Rio; e para não ficar presa no trânsito, um dia tive que pegar o metrô. No vagão, o clima era de baile funk tarja preta. Um grupo de jovens tinha uma atitude bem hostil; eram os donos do pedaço e queriam mostrar isso para todos ali.
Dava pra ver que as pessoas em volta estavam bem tensas e euzinha me sentei bem em frente ao tal grupo. Fiquei meio sem saber pra onde olhar, pro chão? Pra parede? Pra eles? Na dúvida, achei melhor fechar os olhos. Com eles fechados, respirei, inspirei e expirei, me acalmei e quando abri os olhos, meu medo tinha se esvaído. Devo ter encontrado um ponto seguro para olhar porque isso não me incomodava mais. Os garotos continuavam ali, a música, as vozes, suas risadas exageradas, mas era como se eu estivesse apenas observando aquela cena sem participar dela. De alguma maneira, eu sabia que não corria mais risco algum, e realmente terminou tudo bem: cheguei sã e salva ao destino, sem precisar mudar de vagão.
Uma terceira situação foi bem interessante também. O cenário era tempestade de verão no Rio, chovia muito, era água em grande volume, raios, trovões barulhentos, buracos e, pra piorar, era de noite e eu estava vindo da Barra para a Zona Sul, dirigindo sozinha no meu carro. Quem viu essas chuvas ultimamente sabe bem do que eu estou falando. A Lagoa Barra tinha pontos alagados, vários carros parados no caminho, mas voltar já não era uma opção. Eu seguia dirigindo bem aterrorizada, quando, de repente, me bateu um entendimento, um insight — era uma sensação imediata de que nada poderia me acontecer e que eu só precisava ser boa tecnicamente na direção. Aos poucos, meus músculos em volta do pescoço foram se soltando, eu comecei a relaxar, percebi a música gostosa no rádio e mantive o foco em dirigir com cuidado e atenção.
Quando já estava pertinho de casa, percebi que me sentia estranhamente serena, apesar de o ambiente ao meu redor, do lado de fora do carro, estar bastante caótico. Aquilo me fez bem. Senti muito pelas tantas vítimas do temporal, e sei que parece esquisito, mas gostei muito daquela noite. Ela foi bem importante pra mim.
Não são todas as situações nem todas as áreas da minha vida que estão assim tão em ordem. Essas três percepções que contei não costumam acontecer comigo todos os dias, mas acho que a diferença, agora, é que eu conscientemente procuro esse lugar. Aliás, nem sei se é um lugar ou um momento, mas o fato é que me afasta daquilo que me ameaça. Às vezes, tento, mas não consigo chegar a esse lugar; outras vezes, eu nem me lembro de tentar. Só depois que a situação passa eu penso: puxa vida, poderia ter tentado amenizar me afastando! Mas eu persisto! Costumo meditar todos os dias.
Desde que comecei, há quem reclame disso, mas, enfim, foi a minha bicicleta que me fez investir com seriedade na MT, e eu me sinto feliz com essa escolha. Na meditação em si, eu tive alguns avanços, depois alguns retornos pro ponto de início, como num jogo de tabuleiro. Às vezes eu adoro, às vezes acho que demora a passar, tem dias que fico com preguiça, mas continuo na minha prática diária. Recebi uma técnica avançada, mas esse é um capítulo à parte. Recentemente tive que mudar de grupo de meditação, pois o meu parou de acontecer semanalmente.
Levada por uma amiga, acabei chegando a um novo grupo, que tenho achado incrível, do professor Klebér Tani, no Leblon. Acho que estou exatamente onde deveria estar, e essa sensação é muito boa. Sinto que estou dentro da minha própria história, nada de mais, nada grandioso ou extraordinário; apenas sigo passo a passo. É bem mágico!