As relações, em geral, são um caminho tortuoso para se encontrar a felicidade. E uma reta para a infelicidade – sejam família, amigo, trabalho, turma de praia. “Como se um trem passasse”, em cartaz no Teatro Poeira, em Botafogo, é um texto que transborda nuances e personagens, que, longe de cair em estereótipos, procuram aprofundar suas complexidades. A direção meticulosa e a cenografia realista acabam por atrair a plateia para a história que se desenvolve.
Com um recurso dramatúrgico, a introdução de um tertius, o conflito se apoia nas contradições de três personagens: uma mãe superprotetora, professora com dificuldade para deixar ir e dar liberdade ao filho, sem idade definida, portador de algum tipo de deficiência; e a prima da cidade grande, que chega com a fama de ser uma jovem rebelde, punida com o desterro na casa da tia, por alguns excessos de acordo com o olhar da mãe.
A metáfora do trem, como o elemento que passa pelas paisagens e muda a vida de quem os vê, é a presença da visitante que se torna um implacável espelho do relacionamento mãe/filho, centrado no desejo dela. Além disso, em diferentes medidas, a prima também passa de rebelde, infeliz, para alguém que vê, na diferença do outro, a superação da sua própria.
O elenco formado por Caio Scot (Juan, o menino), Dida Camero (Suzana, a mae) e Manu Hashimoto (Valéria, a prima) tem atuação equilibrada. Mas é Caio, no papel de Juan, que é uma joia que promete e muito. Impecável em seu papel, não negligencia um movimento ou um olhar para compor aquela pessoa que quer crescer, que tem sonhos talvez um pouco escondidos, mas parece tornar-se urgente.
Em 70 minutos, ri-se muito, torce-se para que a mãe permita o voo do filho; fica-se vendo o conflito do pai que rejeita o filho, da jovem que procura um caminho de acertos. E a história se delineia na aparente simplicidade e ganha a dimensão pela competente direção da autora Lorena Romanin. Um espetáculo para se apreciar como uma viagem de trem por uma linda paisagem.
Serviço:
Teatro Poeira
Quinta a sábado às 21h
Domingo às 19h
Fotos Patrick Gomez