“Quando comecei a escrever meu novo livro, há uns dois anos, não passava pela minha cabeça que estaria hoje redigindo este texto em Lisboa. No romance “Cinza, Carvão, Fumaça e Quatro Pedras de Gelo” (da Globo Livros), a ser lançado nos próximos dias, o protagonista tem oportunidade de reescrever a sua vida, refazê-la da maneira mais radical, só em busca do prazer e protegido pelo anonimato. O que acontece, espero, é que desperte a curiosidade do leitor.
A ideia de morar fora do Brasil sempre mexia comigo. Mudar nunca foi problema para mim: residi duas vezes, por motivo profissional, em Brasília. Ir para o Distrito Federal, na década de 80, era quase como trocar de país. Na minha produtora, além de consultorias, estou me dedicando mais a escrever ficção (livros, teatro e audiovisual). Tenho projetos em andamento no Brasil e estou avaliando possibilidades em Portugal. Minha mulher é sócia e diretora de uma bem-sucedida creche-escola em Botafogo (Bom Tempo), que continua administrando à distância – uma operação viável graças à Internet.
Nossa motivação para deixar o País não foi busca de trabalho. A lista de justificativas para vir para Portugal é longa – vai desde a segurança, passando pela qualidade de vida a um custo bem inferior, o bom funcionamento dos serviços públicos e a proximidade com cidades europeias que são atrativos permanentes. Portugal é um país lindo, com uma vida cultural exuberante e um povo gentil. O que foi decisivo foi o futuro dos meus filhos trigêmeos adolescentes. Vieram para uma escola internacional que vai assegurar-lhes uma formação acadêmica de excelência, que abrirá porta para uma vida profissional exitosa em qualquer lugar do mundo, inclusive o Brasil.
Não vou falar mal da minha terra, mas me confesso aliviado por não ter podido votar nessas eleições. Fiquei chocado com o nível de beligerância que marcou o confronto que dividiu o País, num clima de agressão que afastou amigos e parentes. O Brasil não é o inferno, e morar fora não é viver no paraíso. Em pouco tempo, já temos muita saudade da nossa gente. Eu, em especial, das minhas filhas adultas. Felizmente, com o lançamento do romance, já vou revê-las. Enfim, a gente vai tentando administrar a realidade, e surgem capítulos que parecem de ficção. Assim como o protagonista do meu livro, cá estou reescrevendo mais um capítulo da minha vida, torcendo para que todos vivam felizes para sempre.”
Luis Erlanger é jornalista e escritor. Seu livro “Cinza, Carvão, Fumaça e Quatro Pedras de Gelo” será lançado no próximo dia 26/11, na Livraria da Travessa do Shopping Leblon.
Foto de Leo Aversa/Divulgação